Título: Cerco à ocupação irregular
Autor: Damé , Luiza
Fonte: O Globo, 20/01/2011, Rio, p. 14

Após mais de 700 mortes na Região Serrana do Rio, o governo federal decidiu mexer na legislação sobre uso e ocupação do solo urbano para evitar novas tragédias no país. O principal alvo do governo é a punição dos agentes públicos que permitem a ocupação de áreas de risco. Segundo o vice-presidente Michel Temer, que coordena os estudos, está afastado o corte de repasses da União para os municípios onde há ocupação de áreas de risco, como encostas e locais sujeitos a inundações:

- Ao apenar o município ou o prefeito você não pode prejudicar o povo. Temos de encontrar uma fórmula que responsabilize aqueles que sejam responsáveis sem impor penalidade ao povo municipal - disse Temer, acrescentando que o governo pretende premiar municípios que cumprem todas as leis de ocupação do solo. - Você poderia ter uma sanção negativa em relação ao Fundo de Participação dos Municípios. Ou seja, o município que cumprir determinadas finalidades terá o auxílio mais efetivo da União para praticar obras nas localidades onde há risco.

O vice não descartou que os agentes responsáveis pela ocupação de áreas de risco possam ser denunciados por improbidade administrativa - ato ilegal cometido por agente público.

Estatuto das Cidades deve ser modificado

Os estudos para mudar a legislação estão sendo feitos por determinação da presidente Dilma Rousseff. Ontem, Temer se reuniu com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para analisar as sugestões enviadas pelos ministérios envolvidos. As mudanças deverão atingir principalmente o Estatuto das Cidades, que estabelece diretrizes urbanísticas dos municípios.

- Precisamos encontrar fórmulas legislativas que possam atender não só às situações emergenciais do Rio, mas que possam aprimorar a legislação para prevenir acidentes dessa natureza. Muitos decorrem da inaplicação da legislação vigente ou às vezes da falta de uma legislação mais objetiva - disse Temer.

O vice e o ministro reconheceram as dificuldades para remoção das pessoas em áreas de risco e defenderam uma parceria entre União, estados e municípios para ações nesse sentido. Na segunda-feira, o ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, disse que, segundo estimativas do governo, 5 milhões de pessoas vivem em áreas de risco no país.

Temer e Cardozo esperam apresentar uma proposta à presidente na próxima semana. Segundo o vice, o governo poderá fazer mudanças na legislação por Medida Provisória, projeto de lei ou emenda constitucional, além de atos administrativos:

- Estamos encontrando caminhos para elaborar essa legislação. Vamos conversar com a presidente no início da próxima semana para apresentar ideias iniciais, mas isso vai envolver a opinião de vários ministérios.

Outra mudança deve ser constitucional e atingirá a obrigatoriedade de cidades com mais de 20 mil habitantes terem plano diretor. A ideia é obrigar todos os municípios a elaborarem um plano de ocupação territorial.

Segundo Cardozo, a intenção do governo, além de endurecer a legislação, é debater mecanismos para que as normas sejam aplicadas. Para o ministro, é preciso construir um novo regramento para disciplinar o uso do solo no país, "fechando fechar as portas para a ocupação irregular":

- O Estatuto das Cidades é uma lei que expressa um conjunto de diretrizes e nem sempre várias das suas expressões normativas têm saído do papel. Nossa missão é dar efetividade a isso. Precisamos superar o campo da retórica normativa e ir para o plano da aplicação real da lei.