Título: Famílias do Piauí aguardam a construção de banheiros
Autor: Lins, Letícia; Remígio, Marcelo
Fonte: O Globo, 23/01/2011, O País, p. 3

Verba chegou, mas o total previsto de unidades não saiu do papel; sanitários instalados não funcionam

LUÍS CORREIA e GUARIBA (PI). Enquanto aguarda a construção do prometido banheiro pela Prefeitura de Luís Correia, a 262 quilômetros de Teresina, a família do vigilante Aureliano de Menezes Alves, formada por 14 pessoas, sendo seis adultos e oito crianças, faz do terreno desabitado nos fundos de casa o sanitário. Não há vaso sanitário ou descarga e as fezes são enterradas. A cada momento, a mulher de Aureliano, Maria Alves Jesus de Menezes, de 50 anos, grita com as oito crianças para que não pisem no quintal para evitar "as frieiras". O local chegou a ter um banheiro com paredes de palha e uma latrina, mas uma forte chuva derrubou a construção.

- Agora nós fazemos nossas necessidades e jogamos no fundo do quintal, onde não está morando ninguém. Estamos como animais e tudo virou brejo - conta Maria Menezes.

A situação da família de Aureliano Menezes era para ser diferente. Há seis anos, a prefeitura informou que as casas do local ganhariam banheiros construídos com recursos da Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

O representante da Funasa em Luís Correia, João Batista Araújo Lima, técnico em saneamento, afirma que a fundação assinou dois convênios com a prefeitura na gestão do ex-prefeito Luís Pedrosa, no valor de R$350 mil para a construção de 300 banheiros. Mas o município instalou cerca de cem. Segundo ele, a maioria não está funcionando porque não tem fossa.

João Batista afirmou que a prefeitura não construiu banheiros no bairro Cearazinho, como estava previsto. Na Praia do Coqueiro, onde moram 2 mil pessoas, estava prevista a instalação de 40 banheiros, mas só foram construídos três. O povoado Camurupim ganhou 82 banheiros, mas nenhum funciona porque a localidade não tem água para abastecer as descargas.

- Os moradores da localidade não têm água nem para beber -, afirmou João Batista.

O secretário de Governo de Luís Correia, Paulo Rubens, afirmou que mau uso das verbas da Funasa ocorreu na administração anterior. Segundo ele, agentes da Polícia Federal e auditores da Funasa visitaram os bairros da cidade, fotografaram as famílias sem banheiro e entrevistaram os moradores da periferia da cidade. Os agentes da PF usaram até GPS para localizar as casas que deveriam ter recebido os banheiros.

Também moradora em Luís Correia, a dona de casa Rita de Cássia de Sousa diz que sua casa não foi contemplada com um banheiro. Ela afirma que não tem dinheiro para construir o banheiro e improvisa com um pedaço de telha de amianto, onde foi colocado um tambor para banho. Mas não há espaço para uma latrina.

- A alternativa encontrada foi a do avião: a gente coloca as fezes num saco plástico e joga em um terreno da igreja católica ao lado da minha casa. Não tem mais onde jogar as fezes a não ser no terreno da igreja, porque estamos cercados por casas de vizinhos. Eu tenho medo de ser castigada por estar jogando fezes no terreno da igreja, mas tenho mais medo é de doenças por causa da falta de higiene.

No município de Guaribas, também no Piauí, a prefeitura não comprovou ao Tribunal de Contas da União a aplicação dos recursos em melhorias sanitárias em domicílios (banheiros). Já em São Raimundo Nonato, no sudoeste piauiense, o TCU constatou que a verba da Funasa financiou rede de abastecimento de água em desacordo com o projeto aprovado. O abastecimento é feito uma vez por semana.