Título: Metas mais baixas de inflação são viáveis
Autor:
Fonte: O Globo, 23/01/2011, Opinião, p. 6

A inflação em 2010 se manteve dentro das metas fixadas pelo governo, mas, ao se aproximar de 6%, atingiu um patamar nada satisfatório. Embora o Banco Central tenha elevado as taxas básicas de juros ao longo do ano, chegando a 10,75% (o que fez o Brasil ocupar novamente o topo desses indicadores entre as principais economias do mundo), e agora somando mais 0,5 ponto à taxa, a verdade é que a política econômica esteve mais direcionada para um crescimento turbinado do Produto Interno Bruto (PIB) do que preocupada com a trajetória da inflação.

Não fosse isso, o governo teria tirado o pé do acelerador dos gastos públicos logo que ficaram mais evidentes os sinais de que a economia brasileira estava em ritmo além do recomendável. No entanto, 2010 foi ano de eleições gerais, e os interesses político-partidários prevaleceram e atropelaram a racionalidade econômica.

2011, já com um novo governo empossado, é tempo de pôr ordem na casa, e a presidente Dilma Rousseff tem dado sinais de que a execução orçamentária será mesmo mais austera e compatível com a atual realidade econômica do país e do mundo.

Alguns fatores que impulsionaram a inflação no ano passado (encarecimento de alimentos, preços elevados de commodities, reajustes dos serviços acima da média) ainda se fazem presentes. Se a política econômica não for cuidadosa, a inflação tenderá a se manter afastada do centro da meta, o que é ruim para um país que ainda não conseguiu apagar a memória inflacionária de décadas anteriores. Assim, não há alternativa melhor a não ser cortar o fôlego da demanda via controle dos gastos.

Para que o governo Dilma reafirme, de fato, seu compromisso com a estabilidade monetária, seria importante que as autoridades começassem a mirar em uma inflação mais baixa nesses próximos quatro anos. As metas de 2013 e 2014 não foram fixadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), e certamente até lá o Brasil reunirá condições econômicas para conviver com inflação mais baixa que os 4,5% do centro da atual meta.

É claro que, como o atual governo se propõe a diminuir a relação entre o endividamento público líquido e o PIB dos 40% do momento para a faixa de 30%, a trajetória esperada para as taxas básicas de juros seria de queda. Ora, para se alcançar uma meta de inflação mais baixa com juros em queda, a política econômica precisará estar com todos os seus instrumentos em sintonia. A política fiscal não poderá andar para um lado e a monetária para o outro, como aconteceu em parte do governo Lula.

O Brasil não precisa abdicar de crescer para assegurar a estabilidade da sua moeda nos padrões desejáveis e dentro da média de inflação internacional, abaixo dos 4,5%. Para tal, o crescimento deve ser sustentável, estimulando-se a formação de poupança interna e uma maior proporção de investimentos. Para que isso ocorra, a principal contribuição precisará vir do setor público. Em vez de poupar, o setor público hoje absorve poupanças do setor privado e assim compromete a sonhada sustentabilidade.

A redução da meta de inflação, que também implicará uma rodada final de desindexação de preços/tarifas, seria consequência natural dessa mudança de enfoque na politica econômica.