Título: Uma geração devastada pela enxurrada
Autor: Vasconcellos, Fábio
Fonte: O Globo, 23/01/2011, Rio, p. 16

Levantamento mostra que 32% dos mortos por causa das chuvas na Região Serrana eram menores de idade

A enxurrada que devastou áreas inteiras em Petrópolis, Nova Friburgo e Teresópolis levou também parte de uma geração. Um levantamento preliminar feito pelo GLOBO mostra que cerca de 32% dos mortos da Região Serrana eram menores de idade. O mais novo deles tinha apenas cinco dias de vida, e morreu soterrado em Friburgo. Nas três cidades, as crianças com até 12 anos representam 21% do total das 601 vítimas que tiveram sua idade identificada. Nesse universo, 8% eram de meninos e meninas com no máximo 5 anos.

A tragédia atingiu com maior força os moradores na faixa etária de 18 a 64 anos, justamente aqueles que formam a base de mão-de-obra das cidades. Do total, 59% dos mortos estavam nesse grupo. Os idosos, ou seja, aqueles com mais de 65 anos, somam 10% das vítimas. O mais velho deles, com 90 anos, morreu também em Friburgo.

Mulheres são maioria entre as vítimas

O baixo percentual de idosos e o grande número de jovens fez com que a média de idade dos mortos na Região Serrana se concentrasse nos 33 anos. Houve mais vítimas mulheres (51%) do que homens (49%).

Na avaliação da professora de economia da Universidade Federal Fluminense (UFF) Hildete Pereira de Melo, os percentuais refletem mais ou menos a distribuição demográfica no Brasil, mas o número de crianças e adolescentes mortos sugere um dado já conhecido dos pesquisadores, e diz respeito ao acesso a métodos contraceptivos.

- A meu ver, o número de crianças e jovens indica que estamos falando de mulheres de baixa renda, com pouca escolaridade. Esse grupo tem menos acesso a métodos contraceptivos e tem, na média, mais crianças que uma mulher de classe média e com escolaridade mais elevada - explica Hildete acrescentando que poderá haver uma mudança de novos moradores para as áreas atingidas em função dos investimentos que serão feitos para recuperar os as cidades, e que vão precisar de mão de obra.

Pela lista utilizada no levantamento, Petrópolis e Teresópolis apresentam percentuais semelhantes com relação ao perfil dos mortos. Teresópolis, contudo, teve 61% dos mortos na faixa de 18 a 65 anos, maior índice entre as cidades. Em Nova Friburgo, os números mudam ou são relativamente maiores se comparado com o outros municípios. Lá morreram, por exemplo, mais homens (56%) do que mulheres (44%). A cidade registra também o maior percentual de vítimas com menos de 12 anos (23%). A média de idade supera as outras cidades: 34,7 anos.

Para o secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Rodrigo Neves, os dados mostram a importância das ações que já começaram a ser feitas para amparar psicologicamente as crianças que ficaram sem os pais, e os adultos que sobreviveram e que terão que conseguir um espaço no mercado de trabalho.

- Atualmente, as sete cidades atingidas pelas chuvas têm 31 mil famílias cadastradas em algum programa social do governo federal. Estamos cruzando esses dados e, com isso, poderemos fazer um acompanhamento dessas crianças e adultos. Nosso objetivo é verificar as necessidades dessas famílias, incluí-las em outros programas e ajudar as crianças, que vão precisar de uma atenção especial.

O secretário municipal de governo de Friburgo, José Ricardo Lima, diz que os dados relavam a situação "lamentável" após o impacto da enxurrada na cidade. Lima conta que a prefeitura já está articula com empresários e comerciantes para ter uma noção total da dificuldades que a cidade deve enfrentar com a perda de tantas vidas:

- Sem dúvida é lamentável e, certamente, vai refletir negativamente na economia do município. Mas vamos superar essas dificuldades, pois os moradores têm demonstrado uma força incrível.

A prefeitura de Teresópolis, segunda cidade com mais mortos, não quis comentar os dados. O secretário municipal de Planejamento, José Alexandre Almeida, informou que a prefeitura fará um mapeamento do perfil das vítimas da tragédia.