Título: Adoção: 37% dos casais só querem crianças brancas
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 25/01/2011, O País, p. 11

Para 53% dos interessados, cor da pele é indiferente

BRASÍLIA. O cadastro de adoções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revela que 53% dos casais inscritos para adoção não fazem restrição à raça da criança, mas 37% - 11.316 do total de 30.378 interessados inscritos - deixaram claro: só aceitam receber em seus lares crianças brancas. Ou seja, para esses, se houver uma criança disponível, mas com outra cor de pele, a adoção será descartada.

De acordo com os números do cadastro, a raça ainda é um fator essencial na hora de uma família escolher uma criança para a adoção. Dos adultos inscritos, 14.259, ou 47%, fazem questão de escolher a cor da pele do futuro filho.

Além das exigências caucasianas, 5,81% (1.764) só aceitam adotar uma criança de pele parda; 1,9% (579) aceita apenas uma criança negra; 1% (304) só admite uma criança amarela; e 0,97% (296), uma criança indígena.

No cadastro para adoção, a maioria das crianças e adolescentes é parda - 50,6%, ou 4.020 de um total de 7.949. Estão disponíveis 2.411 crianças brancas, o equivalente a 30% do total. Também aguardam uma família 1.441 (18%) crianças negras, 41 (0,5%) amarelas e 36 (0,5%) indígenas.

A juíza Andréa Pachá, titular da 1ª Vara de Família de Petrópolis (RJ), alerta para o perigo de se ver a adoção como um processo biológico, e não uma iniciativa de acolhimento.

- É um dado estarrecedor. Ainda é forte a fantasia de que a adoção deve obedecer critérios da família biológica. Família é muito mais um núcleo de afeto do que uma herança biológica. Criança é criança, não tem cor. O discurso que se tem é o de que a criança não pode se sentir diferente. Mas isso é uma forma de racismo - analisa Andréa Pachá..

Metade dos inscritos na Região Sul só quer brancos

A tese faz sentido. No cadastro, metade dos pretendentes à adoção da Região Sul só quer uma criança se ela for branca. Para a magistrada, que lida com esse tipo de situação diariamente, o cenário melhorou nos últimos anos.

- Isso era pior antes. Hoje é mais fácil por uma criança de outra raça em uma família substituta. Temos encontrado casais que queriam uma menina loira de olhos azuis e, depois de visitar um abrigo, mudam de ideia. Esse perfil de menina loira de olhos azuis não é o que temos nos abrigos - afirma Pachá.

Há ainda outras dissonâncias entre o perfil desejado pelos pais e as crianças disponíveis para a adoção, como a idade, os eventuais problemas de saúde e o fato de haver irmãos - nesses casos, não é recomendada a separação deles. As exigências têm impedido milhares de adoções no país.

São 30.378 adultos cadastrados e 7.949 crianças aguardando a adoção. Ou seja: há 3,8 candidatos a pais por menor abandonado. Ainda assim, desde a criação do cadastro, em abril de 2008, o mecanismo proporcionou apenas 267 adoções.

A idade também é determinante na hora de escolher um filho. Os candidatos à adoção preferem crianças mais novas. Apenas 6,8%, ou 2.058, aceitam crianças com idades entre 6 e 10 anos. Outros 228 (0,8%) concordam adotar um menor de 11 a 17 anos. No cadastro, há 2.006 crianças, ou 25% do total, com idade de 6 a 10 anos. Há também outras 3.855 crianças e adolescentes, ou 48,5%, com idade entre 11 e 17 anos.

Entre os pretendentes a pais, 5.342, ou 17,6%, aceitam adotar irmãos. Existem no cadastro 1.531, ou 19,3%, crianças com irmãos. Boa parte das crianças disponíveis - 1.411, ou 17,75% - têm problemas de saúde. O cadastro não possui informação de quantos adultos aceitam adotar uma criança doente.