Título: EUA e líderes da UE pressionam por reformas
Autor: Duarte, Fernando
Fonte: O Globo, 29/01/2011, O Mundo, p. 33
Obama exige que autoridades egípcias não usem violência contra população. Liga Árabe e Israel optam pelo silêncio
AGENTES DA Polícia Antichoque se posicionam diante de manifestantes no Cairo: capital volta a ser palco para os violentos protestos no país
TEL AVIV. As imagens dos protestos no Egito colocaram líderes do Ocidente numa sinuca. Apoiar ou não manifestações populares em favor da democracia, mas que podem abrir caminho para que a oposição fundamentalista islâmica, anti-Ocidente, tome o poder? A magnitude da demonstração popular, no entanto, fez com que muitos países deixassem de lado as luvas de pelica, pressionando o governo do presidente egípcio Hosni Mubarak a realizar reformas políticas e econômicas ¿ além de evitar a violência contra os manifestantes.
Num pronunciamento ontem à noite, o presidente americano, Barack Obama, exigiu que autoridades egípcias parassem de usar a violência contra manifestantes pacíficos. Mantendo uma posição mais clara em relação aos recentes distúrbios, ele disse que os Estados Unidos atuarão em defesa dos direitos do povo egípcio. Obama falou à nação pouco após conversar por telefone com Mubarak.
¿ Os governos têm obrigação de responder aos seus cidadãos. Isso deve ocorre nos Estados Unidos, na Ásia e, certamente, no mundo árabe.
Horas, antes, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, defendera claramente as reformas, mas não uma revolução. Ela escolheu cuidadosamente as palavras para não melindrar Mubarak, um dos maiores aliados dos EUA no Oriente Médio, mas mostrar solidariedade ao povo egípcio. Ela também pressionou o governo do Cairo a evitar a repressão violenta dos protestos e a respeitar a liberdade de expressão dos manifestantes, restaurando o acesso a sites de redes sociais, na internet, e à telefonia celular, bloqueados.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, defendeu o fortalecimento da democracia no Egito, mas também pisou em ovos ao deixar claro que a questão é mais complexa do que se pensa no Ocidente, que, segundo ele, tende a ter uma ¿visão simplista de que o que importa é apenas o ato de promover uma eleição¿.
¿ Uma democracia real é, na verdade, a construção passo a passo, o domínio da lei, os direitos, a força da sociedade civil, as liberdades que existem no país. Acho que precisamos adotar uma visão mais madura em relação a esses países.
Anistia Internacional pede que Mubarak ouça cidadãos
A chanceler federal alemã Angela Merkel, apelou ao presidente Mubarak para que evite ¿vítimas inocentes¿ nos protestos populares. A líder europeia também reclamou da limitação na comunicação no país na tentativa de reprimir as demonstrações antigoverno.
¿ Não há por que deter pessoas ou reduzir o acesso à informação. A estabilidade do país é extremamente importante, mas não a custo da liberdade de opinião ¿ afirmou Merkel.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu que não haja violência nos protestos, tanto por parte dos manifestantes quanto das forças de segurança egípcias. E o chefe da Anistia Internacional, Salil Shetty, recomendou ao Cairo que escute as demandas dos cidadãos.
Mas se o Ocidente decidiu fazer pressão, a Liga Árabe ¿ que representa 22 países ¿ optou pelo silêncio, temerosa das consequências de uma revolução no Egito. O secretário-geral da instituição, Amr Moussa, não comenta os últimos acontecimentos no Egito desde quarta-feira, quando, em Davos, falou sobre a onda de tumultos no Oriente Médio, afirmando que ¿o nome do jogo é reforma¿.
¿ O cidadão árabe está furioso, está frustrado. Essa é a questão ¿ afirmou ele, sem se aprofundar, e remetendo aos outros protestos que varrem a região, da Tunísia ao Iêmen, passando pelo Líbano e pela Argélia.
Os vizinhos israelenses também prefeririam o silêncio. Nenhum integrante do governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu reagiu publicamente às demonstrações. Há tempos Israel adota a mudez quando se trata de problemas internos de países árabes e dos palestinos. Um dos motivos é a consciência de que, se apoiar algum líder regional, pode, na verdade, dar munição a seus opositores.
Para Guidi Grinstein, fundador do Instituto Reut, o governo israelense ¿reza¿ para que essa onda de tumultos no Egito passe logo para evitar uma mudança no status quo entre os dois países. Afinal, a última coisa que Israel deseja é que Mubarak ¿ um dos poucos líderes árabes com bom relacionamento com o Estado judeu ¿ seja deposto. Segundo ele, o presidente pode ser substituído não pelo moderado prêmio Nobel da Paz Mohamed ElBaradei ou pelo filho do ditador, Gamal Mubarak, mas sim pelos fundamentalistas da Irmandade Muçulmana, a maior opositora do atual governo e abertamente anti-Israel.
¿ Há muita preocupação por aqui. Israel tem acordos de paz com o Egito e com a Jordânia, e se os governos pró-Ocidente desses países caírem, então obviamente a paz pode estar em perigo ¿ alerta o cientista político Eytan Guilboa, da Universidade Bar-Ilan.