Título: Um cheque especial de R$8 bi
Autor: Duarte, Patrícia ; D"Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 02/02/2011, O País, p. 21

Dona de 35% do capital total do PanAmericano, a Caixa Econômica Federal (CEF) colocou à disposição da instituição um "cheque especial" de R$8 bilhões. Esse limite de crédito faz parte de um acordo fechado entre a estatal e o novo controlador do PanAmericano, o BTG Pactual - do banqueiro André Esteves -, e será usado sempre que houver necessidade de aumentar a liquidez da instituição. Paralelamente, o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) vai assumir o rombo contábil já conhecido do banco, da ordem de R$3,8 bilhões. A entidade (criada pelos bancos para cobrir perdas de correntistas em caso de quebra de instituições financeiras) concluiu que seu desembolso seria maior se o banco do empresário Silvio Santos fosse à lona. Mas o FGC exigiu o compromisso de que qualquer novo esqueleto que surgir na contabilidade do banco seja de responsabilidade do BTG.

Pela complexa engenharia negociada com o empresário e o BTG, a dívida atual de R$3,8 bilhões foi trocada por R$450 milhões em recebíveis do BTG - títulos que, se forem pagos no vencimento, daqui a 17 anos, renderão os mesmos R$3,8 bilhões. Caso o BTG decida pagar os R$450 milhões agora, o FGC terá uma perda de R$3,35 bilhões. Se o PanAmericano fosse liquidado pelo Banco Central (BC), o FGC teria de cobrir R$2,2 bilhões para os investidores e depositantes do banco. Com os R$2,5 bilhões que já havia alocado no PanAmericano, a perda subiria a R$4,7 bilhões.

- A liquidação é ineficiente e não se consegue recuperar os ativos para pagar os credores - justificou Gabriel Jorge Ferreira, presidente do Conselho de Administração do FGC. - Em vez disso, trocamos por um credor que é uma instituição financeira (o BTG) e vamos receber uma parte do dinheiro.

Entre analistas, contudo, a atuação do fundo causou estranheza.

- Foi uma medida inteligente, mas criou-se um precedente grave. Se houver outro problema, num volume bem maior, vai ter de ser solucionado pelo FGC - diz Erivelto Rodrigues, presidente da Austin Rating.

O FGC administra um patrimônio da ordem de R$30 bilhões atualmente. O fundo é alimentado por uma alíquota de 0,15% que os bancos recolhem sobre todos os depósitos (à vista e a prazo). - O rombo pode ser ainda maior, com dívidas trabalhistas e créditos ruins. Por isso o FGC abriu mão das garantias de Silvio Santos e pressionou pela venda - diz um executivo que acompanhou as negociações.

Dos R$8 bilhões acertados com a CEF, R$6 bilhões ficarão à disposição para eventuais compras de carteira de crédito do PanAmericano. De modo geral, e se fizer as aquisições, a estatal deverá ficar com as carteiras de crédito em seus ativos. Mas existe a possibilidade também de, ao se determinar um prazo, devolver a carteira ao PanAmericano e receber em troca juros. Os demais R$2 bilhões poderão ser usados na compra de Certificados de Depósitos Interbancários (CDI). Neste caso, a estatal seria remunerada pelas taxas de mercado. O BTG também tem o compromisso de garantir crédito ao PanAmericano.

- Temos dois sócios, a Caixa e o BTG, que vão dar suporte às operações do banco. Eles podem comprar as carteiras de crédito que vamos originar, a preços de mercado - explicou José Luiz Acar Pedro, novo presidente do PanAmericano. - O que queremos é formar um funding competitivo, pois vamos competir com Votorantim, Itaú e Bradesco.

Sistema permaneceu gerando fraudes

O governo fez malabarismos para evitar que a CEF tivesse de injetar recursos próprios - ou seja, públicos - com a descoberta do novo rombo de R$1,3 bilhão no PanAmericano este mês. Em junho passado, já haviam sido descobertos no banco outros R$2,5 bilhões em fraudes contábeis. Para evitar a quebra da instituição financeira, o FGC fez um empréstimo e recebeu em troca o patrimônio de Sílvio Santos, incluindo o SBT.

Mesmo sem injetar recursos, a estatal está registrando prejuízo ao se olhar o valor de mercado do PanAmericano. Quando o negócio foi anunciado, no dia 1º de dezembro de 2009, o banco valia R$2,114 bilhões, segundo dados da Economática. Ontem, era R$1,276 bilhão, com queda de 40%.

Ontem, um dia após a venda para o BTG, as ações preferenciais (PN, sem voto) do PanAmericano subiram 22,53%, a R$5,22, liderando as altas da Bolsa de São Paulo. Em um dia, o PanAmericano ganhou R$235 milhões em valor de mercado. Mas as ações do banco ainda acumulam queda de 22,8% desde que o rombo foi revelado, em 10 de novembro do ano passado. O Ibovespa, índice de referência do mercado, subiu ontem 1,91%, aos 67.847 pontos. O dólar comercial recuou 0,60%, para R$1,664.

O novo rombo de R$1,3 bilhão veio também de uma nova fraude detectada após a chegada da atual diretoria, em novembro passado. O sistema do banco continuou produzindo informações contábeis inexistentes, o que levou a uma maior inconsistência financeira. Entre essas informações falsas estavam as geradas por carteiras já liquidadas ou vendidas para outros bancos mas que ainda eram contabilizadas nos ativos. Esse mecanismo de fraude com as carteiras de crédito já havia sido detectado no meio do ano passado, quando o primeiro rombo de R$2,5 bilhões foi levantado, mas não dentro do sistema do banco.

Agora, o R$1,3 bilhão a mais também veio dos "prejuízos correntes" que as fraudes continuaram gerando entre junho e novembro do ano passado, período entre a descoberta do primeiro rombo e a nova diretoria assumir o comando do banco. Os novos dirigentes da instituição também fizeram mais provisões, elevando o descompasso contábil.

COLABORARAM: Geralda Doca e Bruno Villas Bôas