Título: Com lojas vazias comerciantes defendem ditador
Autor: Duarte, Fernando
Fonte: O Globo, 03/02/2011, O Mundo, p. 30

CAIRO. Mesmo para os padrões cordiais do povo egípcio, a oferta de pão com mortadela, chá ou café surpreende quem entra na loja de perfumes de Kamel Aly, no tradicional mercado Khan el-Khalili, no Cairo antigo. Mas é justamente pela raridade das visitas que o comerciante oferece um tratamento especial que inclui explicações detalhadas sobre sua visão política, redundante diante de várias fotos de Hosni Mubarak decorando a parede.

¿ Gostamos de Mubarak, que mantinha o país em ordem. Nunca antes tinha visto tão poucos turistas aqui. Todo mundo fugiu por causa desses baderneiros ¿ diz Aly, apontando para uma das alamedas do mercado em que há mais gatos que pessoas.

Na loja do lado, Khaled Mohamed não tem uma parede dedicada ao presidente egípcio, mas ainda nutre a esperança de que o velho brigadeiro volte atrás na decisão de deixar o poder em setembro. É a única opção que ele vê para evitar um encalhe de suvenires numa banca já abarrotada com tapetes, papiros e miniaturas de pirâmides.

¿ Falam muito mal da polícia de Mubarak, mas quando ela estava nas ruas ninguém saqueava o mercado. Temos colegas que perderam toda a mercadoria, jóias, telefones celulares. Eu é que estou com vontade de protestar agora.

Se sua lógica é questionável, ao menos os comerciantes soam mais espontâneos que os participantes de um dos ramos da manifestação pró-Mubarak que por lá passava no final da manhã. (F.D.)