Título: Na contramão de Rio e SP
Autor: Remígio, Marcelo
Fonte: O Globo, 07/02/2011, O País, p. 3

Noite de 8 de janeiro, Alexandre Diniz do Nascimento, de 31 anos, é morto com cinco tiros no município de Bayeux, região metropolitana de João Pessoa. Ele é mais um na estatística de assassinatos da Paraíba que, assim como o restante do Nordeste, amarga uma explosão da violência. A única exceção, no momento, é Pernambuco. Um levantamento feito por pesquisador da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) aponta que, nos últimos dez anos, os estados nordestinos enfrentam um crescimento linear do número de assassinatos, diferentemente do Sudeste, que reduziu os homicídios. Somente a Bahia registrou um aumento de 50,72% entre 2006 e 2010, passando de 3.222 mortes anuais para 4.856.

Com 96 mil habitantes e distante seis quilômetros da capital, Bayeux é um dos municípios paraibanos mais violentos, com uma taxa anual de 83 homicídios por cem mil habitantes. O limite aceitável pela Organização Mundial Saúde (OMS) é de dez mortes por cem mil habitantes. A cidade espelha a dura realidade de crimes que assustam a população. Entre 2001 e 2009, os homicídios cresceram 158% na Paraíba. O levantamento feito na UFCG tem como base os dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde.

Em Alagoas, o cruzamento de dados de mortes violentas registradas pelo IML, polícias Civil e Militar e Secretaria estadual de Defesa Social mostra que, em 2009, o estado teve 1.998 homicídios. No passado, o total chegou a 2.218, um acréscimo de 11%. A estatística não inclui casos de latrocínio (roubo seguido de morte).

- Os estados enfrentam hoje a migração do crime. Assim como empresários se instalaram na região para implantar atividades lícitas, criminosos de outras regiões, como o Sudeste, também encontraram nos estados um amplo mercado para o que é ilícito, como o tráfico de drogas - explica o professor José Maria Nóbrega, da UFCG, autor da pesquisa sobre a violência no Nordeste.

Pernambuco é exceção na região

Segundo Nóbrega, estatísticas baseadas no SIM mostram que, entre 1996 e 2008, a taxa de homicídios no Piauí subiu 203%. No ano passado, o estado registrou 204 homicídios, 10% a mais do que em 2009, segundo a Delegacia Geral da Polícia Civil. Só em Teresina, foram 160 casos. No Ceará, o aumento nos homicídios chegou a 122% no mesmo período; no Rio Grande do Norte, a 178%; em Sergipe, a 134%; no Maranhão, a 242%. Pernambuco enquadra-se em outra realidade: em 2010 houve redução de 14% nos homicídios em relação a 2009. No entanto, segundo Nóbrega, 94,6% dos homicídios não são investigados no estado. O pesquisador destaca que não há uma uniformidade nos critérios estatísticos dos estados. E a falta de informação prejudica a formulação de políticas públicas de segurança. Os percentuais podem ser maiores.

Na contramão do Nordeste, Rio e São Paulo comemoram a redução de homicídios. Levantamento divulgado pela Coordenadoria de Análise e Planejamento da Secretaria de Estado da Segurança Pública de São Paulo mostra que, em 2010, a taxa de homicídio doloso - com intenção de matar - chegou a 10,47 para cada cem mil habitantes. Em 1999, a taxa era de 35,27 mortes por cem mil habitantes - uma redução de 70,3% no período. A média brasileira é de 24,5 homicídios para cada cem mil habitantes.

Já no Rio de Janeiro, o Instituto de Segurança Pública (ISP) divulgou que o estado encerrou 2010 com uma redução de 17,7% no total de homicídios em relação ao ano anterior. Em 2009, foram 5.794 assassinatos, 1.025 a mais que no ano passado. Segundo o sociólogo Glaucio Soares, do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj), tanto o Rio quanto São Paulo têm trabalhado políticas de segurança pública a longo prazo:

- Políticas inteligentes devem ser de Estado e não deste ou daquele governo. Em São Paulo, colhemos os frutos plantados a partir de 1999. No Rio, houve diversas melhorias, particularmente nos últimos quatro anos. Nos dois casos, houve transferência do poder decisório na área de Segurança Pública e vontade política - analisa Soares, que identifica um quadro diferente no Nordeste. - A cultura cívica está menos desenvolvida, há menos vontade política e padrões tradicionais no governar. Falta treinamento policial, conhecimento e, sobretudo, uma elite política mais consciente da importância da segurança pública.

Em Pernambuco, Soares diz que houve vontade política de combater o crime, mais conhecimento na área de segurança pública e mais recursos. No entanto, ele afirma que ainda há muito por fazer. O GLOBO enviou perguntas ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, sobre a violência no país, mas a assessoria de imprensa disse que o ministro não iria fazer comentários sobre o assunto.

COLABOROU: Jamildo Melo, de Recife