Título: Campo minado no Congresso
Autor: Jungblut , Cristiane
Fonte: O Globo, 14/02/2011, O País, p. 3

A presidente Dilma Rousseff recebeu uma pesada e antiga herança do governo Lula no Congresso Nacional. Entre as 24 medidas provisórias que tramitam na Câmara eno Senado, 21 foram editadas no governo passado, sendo que dez estão trancando apauta de votações da Câmara. Muitas dessas medidas vão na contramão do corte de R$ 50 bilhões anunciado na semana passada, pois implicamna criação de cargos e no aumento dos gastos públicos. Aliados acreditam que oCongresso votará até maio propostas antigas, anão ser que se use a janela inaugurada agora por Dilma para enviar por projeto a matéria que trata do salário mínimo. Otemor éque ajanela, criada na gestão do ex-presidente da Câmara e hoje vice-presidente Michel Temer, uma vez aberta, sirva para os parlamentares colocarem projetos explosivos em votação. Uma dasMPs que poderá gerar polêmica na votação, inclusive entre integrantes da base aliada, é a que cria a Autoridade Pública Olímpica (APO), ratificando o protocolo assinado entreUnião, oestado do Rio de Janeiro eo município do Rio, que cria o consórcio de ação para garantir a preparação e realização das Olimpíadas de 2016. A MP cria 484 cargos em comissão. Entres eles, 184 com salários que variam de R$ 18 mil e 22,1 mil. A oposição está pronta para bombardear a criação demais cargos federais e a falta de fiscalização da estrutura.Mas aMP também provoca briga na base aliada. O cargo a ser criado é pleiteado pelo PCdoB, mas Dilma pretende nomear o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, justamente para dar maior visibilidade e garantir o cumprimento dos prazos das obras.

Na herança de Lula também há uma MP que cria uma empresa para administrar hospitais universitários, ligada ao Ministério da Educação. A empresa será administrada por um conselho de administração e uma diretoria executiva. A MP estabelece que a empresa terá sede emBrasília,mas poderámanter escritórios, representações, dependência e filiais em outros estados. Para que a empresa seja implantada, autoriza acontratação, por tempo limitado e sem licitação, de pessoal técnico e administrativo, até que seja feito concurso público. A oposição vai apontar, alémdo aumento de gastos, a inconstitucionalidade damedida, alegando que fere a autonomia universitária.

Variedade de temas abre brecha para emendas

● Ogoverno Dilma Roussefftambém deverá enfrentar problemas com a bancada ambientalista na votação de MP que, entre outras coisas, institui o Regime Especial de Incen- tivos para o Desenvolvimento de Usinas Nucleares (Renuclear). Antes mesmo de conseguir no Congresso aautorização para a instalação de usinas, oministro de Minas e Energia, Edison Lobão, já oferece incentivos, na tentativa de induzir investimentos nesse tipo de energia. Já há estados brigando para sediar as novas usinas. A mesma MP que institui o Renuclear trata de outros 12 temas diferentes.Mesmo caso da MP 513/10, com oito assuntos distintos. Isso sempre abre margem para a apresentação de emendas por parte dos parlamentares, que poderão aumentar gastos públicos, os chamados ¿jabutis¿.

Na lista de MPs do governo passado, estão ainda a liberação de crédito para o BNDES. Sobrou para o governo Dilma umdívida de R$ 30 bilhões pela concessão de novo crédito ao BNDES, para aumentar a participação do banco na capitalização da Petrobras. Outra MP autoriza a União, acritério do Ministério da Fazenda, a emprestar até R$ 20 bilhões ao BN- DES para o uso em financiamentos do projeto do Trem de Alta Velocidade, que ligará os municípios do Rio e de Campinas (SP). A primeira MP da lista, a 501, deverá causar constrangimentos ao governo. Isso porque ela sofreu emendas no Senado, voltando para a Câmara, impostas justamente pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). Olíder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), admitiu que não será fácil se livrar das MPs, mas argumentou que elas fazemparte do processo de governar e da vida do Legislativo. ¿ Vai ser difícil ¿- disse Vaccarezza, sobre o trabalho de limpar a pauta. Semana passada, a presidente Dilma deu demonstrações de que não quer ficar refém de assuntos do governo passado. Dilma recorreu a uma manobra para enviar ao Congresso o projeto que trata da correção do salário mínimo, permitindo que ele passe à frente das MPs que trancam a pauta. O Palácio do Planalto espera que o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), agilize as votações. Semana passada, a primeira com votações na Casa, foram votadas duas MPs, sem maiores problemas.