Título: Exílio na Riviera do Mar Vermelho
Autor: Higueras, Georgina
Fonte: O Globo, 13/02/2011, O Mundo, p. 38

Antiga vila de pescadores, cidade turística é motivo de orgulho nacional

No momento mais difícil de sua vida política, Hosni Mubarak recuou, na sexta-feira, para um lugar por onde ele e os egípcios desenvolveram um orgulho especial: a cidade de Sharm el Sheikh, na Península do Sinai. Antes uma calma aldeia de pescadores, a cidade agora é um lugar de hotéis cinco estrelas, uma rival às pirâmides como atração turística ¿ e um lembrete de uma das maiores realizações de Mubarak e do Egito, a retomada da Península do Sinai, antes ocupada por Israel.

A retomada do Sinai começou com guerra ¿ o conflito de 1973 que infligiu a Israel um de seus poucos reveses militares ¿, mas só veio através de um subsequente tratado de paz que Mubarak passou grande parte de sua carreira defendendo. Durante seus 30 anos no poder, ele frequentemente mencionou a devolução de Sinai como prova do valor do tratado, e o desenvolvimento de Sharm el Sheikh e outras cidades em uma ¿Riviera do Mar Vermelho¿ serviu para enfatizar seu ponto. Numa área que o general israelense Moshe Dayan cobiçava como um prêmio estratégico, com vista para o Estreito de Tiran, na junção do Mar Vermelho com o Golfo de Aqaba, milhares de egípcios agora ganham a vida recebendo aviões carregados de turistas europeus e americanos.

Apropriadamente, a cidade agora pode servir como uma espécie de exílio interno, confortável para o homem que tem ligações com Cairo (mas suficientemente longe de lá) e para satisfazer a multidão que o tirou do cargo. De fácil acesso por voos diretos de muitas metrópoles, Sharm el Sheikh fica a oito horas de carro para quem sai da capital pelas traiçoeiras estradas do deserto, guardadas por vários postos de controle ¿ um lugar seguro para um homem cuja partida teve fogos de artifício e aplausos.

A casa de Mubarak tem sido um paraíso pessoal e um espaço público. O líder de 82 anos rotineiramente se isolava lá para alguns períodos de descanso. Ele também recebia a cúpula do Oriente Médio para negociações em sua casa, que está à beira de um campo de golfe no Movenpick Resort, com vista para o Golfo de Aqaba. Nunca era difícil dizer quando ele estava. Guardas rodeavam a estrada entre o aeroporto e sua casa, uniformemente espaçados ao longo do percurso.

Presidentes dos Estados Unidos e secretários de estado rotineiramente resistiam às altas temperaturas e ao calor seco da cidade para buscar conselhos de Mubarak e tentar avançar nas negociações de paz entre Israel e Palestina. Em setembro, Mubarak recebeu a secretária de estado Hillary Rodham Clinton, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e o presidente palestino, Mahmoud Abbas, em uma luxuosa sala de reuniões em sua casa. As reuniões de cúpula realizadas em Sharm el Sheikh, no entanto, têm historicamente poucos resultados concretos.

Autoridades egípcias têm preferido Sharm el Sheikh ao Cairo para reuniões porque a região tem acomodações de alta classe e é protegida mais facilmente. Hoje, a cidade estaria normalmente no meio de sua alta temporada. Mas os hotéis tiveram que dispensar seus funcionários, já que os visitantes fizeram suas malas e foram para casa, ou ficaram fora durante os 18 dias de revolta que levaram à saída de Mubarak do governo.

Mas a cidade já passou por tempos difíceis antes. Em 2005, ataques terroristas mataram 88 turistas. Em dezembro, uma onda de ataques de tubarões ganhou as manchetes depois que um deles matou uma mulher que mergulhava.