Título: Direitos preservados
Autor:
Fonte: O Globo, 14/02/2011, Editorial, p. 6

É consenso, dentro e fora do Poder Judiciário, que a Justiça brasileira tem um inaceitável contencioso de lentidão, atrasos processuais, procrastinações e outros desserviços. Dessa realidade resulta como principal prejudicado aquele a quem o Judiciário deveria beneficiar - o contribuinte. Mas é fato também, igualmente incontestável, que a modernização de ritos judicantes conseguiu nos últimos anos, e de forma louvável, desafogar a pauta das Cortes, principalmente nas últimas instâncias. A aprovação da emenda constitucional 45, em 2004, foi providencial passo para, se não acabar com a lentidão nos tribunais, ao menos desafogar o gargalo que entrava o andamento de processos, dando principalmente ao Supremo e ao Superior Tribunal de Justiça meios de acelerar a tramitação de ações.

A instituição da súmula vinculante foi passo essencial para limpar agendas. E de igual maneira tem contribuído para desafogar o Judiciário o princípio da repercussão geral, pelo qual o Supremo Tribunal Federal pode selecionar os processos a serem julgados, à luz da importância do objeto da ação para a sociedade. A criação do Conselho Nacional de Justiça foi essencial para cobrar mais eficiência e produtividade dos tribunais inferiores. Em razão disso, tais Cortes passaram a apresentar melhores índices de produção. Foram todas importantes iniciativas, mas tais providências, ressalvados o mérito e os inquestionáveis bons resultados graças a elas obtidos, não são suficientes para dar conta das demandas do Poder. Há muito ainda o que fazer para tornar a Justiça do país ágil e proficiente.

Tal é o entendimento, inclusive, do presidente do STF, Cezar Peluso, que, ao discursar no encerramento do recesso do Judiciário, propôs a retomada do Pacto Republicano - cuja primeira versão resultou na aprovação da emenda 45 - para recolocar a reforma do Judiciário na agenda do Congresso, e dar respostas concretas à missão de acabar com a lentidão do andamento dos processos.

O convite de Peluso a uma outra etapa do Pacto, a terceira, não se fez apenas como conclamação. O presidente do STF se estendeu a pontos específicos do gargalo. Ele sugeriu, por exemplo, a edição de emenda constitucional que garanta a aplicação imediata de decisões dos Tribunais de Justiça ou do Tribunal Regional Federal, sem prejuízo do direito constitucional ao recurso nas instâncias superiores. Acaba-se, dessa forma, com o poder suspensivo das apelações, raiz de grande parte dos casos de inaplicabilidade de sentenças e, por consequência, de realização da justiça.

A proposta, concretizada, terá o grande mérito de acabar com a prática generalizada de procrastinar decisões e de limitar o efeito de brechas legais das quais advogados se valem para livrar seus clientes do acerto de contas com a Justiça. A iniciativa visa a desafogar tribunais - e tem o poder de fazer valer decisões de grande interesse para a sociedade. É o caso, por exemplo, dos políticos apanhados pela Lei da Ficha Limpa, que se elegeram e, diferentemente do que ocorreu, não poderiam ter assumido o mandato.

O Pacto deve ser entendido pelo princípio de que assegurar justiça rápida à sociedade não implica cortar direitos e prejudicar o exercício profissional dos advogados. Aceito, e estando todos os Poderes integrados pelo pressuposto do interesse social, ele será poderoso instrumento para o Judiciário enfrentar demandas processuais e prestar à população um serviço eficiente, ágil.

Assegurar justiça ágil e eficiente para a população não atropela a Constituição