Título: Argentina dos Kirchner se isola no mundo
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Fonte: O Globo, 20/02/2011, Opinião, p. 6
Um colunista argentino explicou o que está por trás da permanente campanha oficial para criar toda a sorte de dificuldades para os meios de comunicação "inimigos" e facilidades para os chamados oficialistas. "Néstor Kirchner sempre achou que uma das principais fontes de poder, além do dinheiro, é o controle da informação", escreveu o jornalista em artigo no "La Nación". "Admitia que sua luta contra o Grupo Clarín, e outros veículos independentes ou de oposição, era, no fundo, pelo manejo da agenda nacional."
Grande parte da energia dos governos Kirchner tem sido usada na manipulação da agenda nacional, em termos das informações, versões, dados e índices que chegam à população. As medidas com aquele objetivo são sempre apresentadas com invólucros meritórios de "regulamentação", "disciplina", "equilíbrio", mas não passam de expressão do objetivo do ex-presidente, compartilhado por sua viúva, a presidente Cristina, de controlar a informação na sociedade.
Uma das ferramentas mais eficientes no arsenal da Casa Rosada é a distribuição arbitrária das verbas oficiais de comunicação e publicidade. Em 2010, 47% delas foram para veículos de mídia impressa afinados com o governo, como "Pagina 12" e "Tiempo Argentino". No que se refere à TV, 67,7% foram para um único canal, o 9.
Uma das investidas mais violentas contra a liberdade de expressão é a chamada Lei de Meios de Comunicação, encaminhada ao Congresso logo após as eleições de 2009, em que o governo perdeu a maioria parlamentar. Em dois meses ela foi aprovada e sancionada, antes que a nova legislatura assumisse. O objetivo não declarado, mas patente, é estabelecer critérios que ponham em risco a sobrevivência empresarial dos grupos de comunicação independentes. A empresa Papel Prensa, responsável pelo abastecimento de 75% do mercado argentino, é uma boa ilustração do que ocorre. Controlada pelos dois principais grupos de mídia locais, "El Clarín" e "La Nación", tem uma participação de 27% do governo. Este tem feito de tudo para deslegitimar o controle privado da companhia. Com isso, a Casa Rosada passaria a dominar o fornecimento de papel imprensa, com consequências óbvias.
Outra intenção anunciada pelo governo Cristina Kirchner é criar um organismo para "regulamentar" a publicidade privada. Se efetivada, será mais um golpe para a liberdade de expressão e outra intervenção desastrosa numa área vital para a iniciativa privada.
É por essas e por outras que a Argentina se converte em pária mundial. Recentemente, correu o risco de ser expulsa do FMI por manipular os índices de inflação. A solução, para a qual contribuiu o Brasil, foi enviar uma missão do Fundo a Buenos Aires para "ensinar" o governo a calcular a inflação. Como se não fosse suficiente, as autoridades argentinas estão tratando como um grande incidente diplomático a apreensão de "material não declarado" num cargueiro da Força Aérea americana que transportava itens para um treinamento de que participaria a Polícia Federal argentina. Cristina Kirchner estimulou a população a defender a "soberania nacional".
É o que dá quando um governo faz do confronto seu método oficial de resolução de problemas e da manipulação de informações, de grupos e de interesses seu meio de ação. No mínimo, cria um clima de ódio político que se reflete na vida dos cidadãos.