Título: Dirceu usa PT em busca de poder no governo
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 20/02/2011, O País, p. 12

BRASÍLIA. Ao mesmo tempo que se mobiliza por uma reabilitação política, o ex-chefe da Casa Civil e deputado cassado José Dirceu tenta usar o partido para voltar a ter influência no governo Dilma Rousseff. E com isso, retomou nos bastidores um enfrentamento político com o chefe da Casa Civil, ministro Antonio Palocci. Segundo aliados, Dirceu quer unir forças no PT para fazer um contraponto.

A articulação de Dirceu nas últimas semanas foi resultado da insatisfação de setores do PT, que estão contrariados com a influência de Palocci no governo e com o espaço reduzido que a presidente Dilma tem dado à chamada "velha guarda petista". Junto com o movimento de reabilitação depois do escândalo do mensalão, deputados e integrantes do comando petista tentam se fortalecer no governo.

Expectativa era de maior influência do partido

Durante a campanha presidencial, a expectativa desse setor do PT era de que o partido mandaria mais no governo Dilma do que no governo Lula, como chegou a revelar o próprio Dirceu num encontro com sindicalistas na Bahia. Mas isso não aconteceu. Dilma escolheu novos interlocutores no PT, como o atual presidente da legenda, José Eduardo Dutra, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, além do próprio Palocci.

- O Zé Dirceu não é ministro. Então, por que tem que ter espaço no governo? Mas ao mesmo tempo, ele não vai deixar a política. É do DNA dele. Dirceu é dirigente do PT. Isso não é ilegítimo. Ele ganhou mandato da militância do PT - argumentou José Eduardo Dutra.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem dado apoio público à reabilitação política de Dirceu e de outros citados no processo do mensalão, fez questão de abafar o movimento precoce pela sua candidatura presidencial em 2014. E verbalizou claramente que o projeto tem que ser Dilma. Foi uma forma de evitar uma divisão petista e, com isso, enfraquecer o governo. Ele resolveu dar esse recado para vários petistas ao mesmo tempo num jantar em Brasília na noite de comemoração dos 31 anos de fundação do partido.

Segundo aliados, Dirceu vai usar essa mobilização com militância e viagens por todo o país para também discutir temas econômicos e sociais. Com isso, ele se fortalece internamente e passa a fazer o contraponto interno. Isso já foi feito durante reunião do Diretório Nacional do PT, no dia 10 de fevereiro, quando fez críticas ao corte orçamentário de R$50 bilhões, tese defendida no governo por Palocci.

Diante da divulgação da notícia, Dirceu chegou a escrever em seu blog um texto intitulado "Briga minha com os ministros Mantega e Palocci não existe". No artigo, afirma: "tudo o que eu disse na reunião do Diretório Nacional do PT está em meu blog. E eu não me retratei. Minha relação com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, é de respeito e amizade. Muito menos minha fala no PT pode ser reduzida à simplificação de críticas aos juros, ou ao corte orçamentário".

Mas em outro texto, publicado na semana anterior, o próprio Dirceu fazia críticas à política monetária, no artigo intitulado "Baixar os juros, a única solução". Dirceu escreveu que "na verdade a solução é e continua a ser uma só: reduzir os juros para diminuir a diferença entre os que são pagos aqui e os lá de fora".

Perda de influência incomoda grupo

Interlocutores da presidente Dilma ressaltam que ela tem grande consideração por Dirceu. Mas revelam que o ex-chefe da Casa Civil perdeu a influência no Palácio do Planalto. Isso tem incomodado ainda mais o grupo político de Dirceu dentro do PT. Para recuperar influência interna, ele passou a usar o seu peso político até mesmo na bancada do PT.

Surpreendido com a vitória interna do presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), contra o líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), em dezembro passado, Dirceu decidiu reagir. Foi a retomada de forças por parte do ex-chefe da Casa Civil que ajudou a impedir uma implosão do grupo.

Abatido com a derrota para Marco Maia, por muito pouco Vaccarezza não sofreu outro revés. Houve forte mobilização de deputados para destituí-lo da liderança do governo. Já havia candidatos para a vaga, como Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Henrique Fontana (PT-RS). Ao perceber a mobilização, Dirceu assumiu a defesa de Vaccarezza, mandou recados ao Palácio do Planalto, e conseguiu manter no cargo o seu aliado.

Dirceu também entrou na disputa pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e influenciou o acordo que definiu a indicação de João Paulo Cunha (PT-SP), réu no processo do mensalão que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF).

- A atuação de Dirceu na bancada foi para ajudar. Ele entrou para baixar a temperatura, como todo mundo fez - minimizou Dutra.

João Paulo disputava com o deputado Ricardo Berzoini (PT-SP). Acabou vencendo a tese de Dirceu que era importante para o processo do mensalão que João Paulo estivesse com um cargo de visibilidade.

Ao mesmo tempo, o ex-deputado fortaleceu seu grupo, já que Berzoini tinha apoiado Marco Maia. Também foi o ex-chefe da Casa Civil que anunciou que o ex-tesoureiro Delúbio Soares havia apresentado um pedido de refiliação ao PT.