Título: É preciso vontade
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Fonte: O Globo, 21/02/2011, Opinião, p. 6

Acada início de governo ressurgem as esperanças de que o país faça uma reforma tributária capaz de compatibilizar a estrutura de impostos brasileira à realidade do mundo globalizado.

Os instrumentos de arrecadação vêm se aperfeiçoando com a troca de informações entre as diferentes esferas do fisco (federal, estadual e municipal). A formalização também se impõe pela necessidade de as empresas terem acesso ao crédito e prestarem informações verossímeis sobre a realidade dos seus negócios.

A tendência, então, é que a base de contribuintes continue se ampliando daqui para a frente. No entanto, esse processo poderia se acelerar se a estrutura tributária do país fosse atualizada. Há uma exagerada quantidade de impostos, taxas e contribuições, com alíquotas variadas, que nem ao menos diminuem à medida que a arrecadação aumenta.

Um dos principais entraves à reforma é o temor dos governantes que a mudança redunde em queda de arrecadação no curto prazo. Os especialistas favoráveis à reforma garantem que isso não aconteceria porque uma simplificação tributária multiplicaria os negócios.

E existem casos recentes comprovados de recuperação de receita quando impostos são reduzidos. Mas, infelizmente, se os governantes não se convencerem disso, o impasse não será contornado.

O problema talvez possa ser atenuado com regimes transitórios, pelos quais a redução de alíquotas (quando previstas na reforma) esteja condicionada ao aumento da base de contribuintes e/ou a acréscimos de arrecadação.

O importante é quebrar alguns tabus, e essa iniciativa possivelmente terá de ocorrer primeiro na esfera federal - embora a reforma se faça mais necessária no plano estadual, do ICMS.

A desoneração dos investimentos é a que promete avançar mais, pois não faz qualquer sentido tributá-los. Mas há outros itens que pesam sobre a cadeia produtiva, como os chamados custos trabalhistas. O governo vem acenando com a possibilidade de diminuir os encargos incidentes sobre a folha de pagamentos, em especial a alíquota da contribuição patronal para o previdência social (de 20% para 14%). Seria um bom exemplo se levado avante, com a vantagem de não exigir quorum privilegiado no Congresso (este torna quase inviável a aprovação de uma reforma tributária).

Obviamente, outro entrave à reforma é a compulsão dos políticos e dos governantes de aumentarem os gastos públicos, sem que que tais despesas estejam atreladas ao alcance de metas de eficiência e produtividade. Parte-se do princípio de que a falta de recursos é a razão da má qualidade dos serviços públicos. Embora em certas situações isso possa ser verdadeiro, a prática mostra que, sem um claro esforço de aumento de eficiência, elevar os gastos equivale a pôr dinheiro em saco sem fundo.

O país amadureceu economicamente nos últimos anos, e, em termos políticos, reúne condições para avançar também na direção de uma reforma (ou de várias reformas) tributária. Não pode ser por falta de vontade dos governantes ou desinteresse dos parlamentares que ela deixe de ser aprovada.