Título: Petróleo em nível pré-crise
Autor: Batista, Henrique Gomes; Ordoñez, Ramona
Fonte: O Globo, 22/02/2011, Economia, p. 17

Confrontos na Líbia levam barril do Brent a US$108 e analistas já falam em US$140

Aescalada dos protestos na Líbia fez com que os preços do petróleo atingissem os patamares registrados antes do estouro da crise financeira global, em setembro de 2008. O barril do Brent, negociado em Londres, avançou 5,6%, para US$108,03. Já o do tipo leve americano, negociado na Bolsa Mercantil de Nova York, teve alta de 6,3%, para US$95,39. Para analistas, a volatilidade dos preços deve se manter e o barril pode ultrapassar nos próximos dias o recorde de US$140, de julho de 2008, se a produção for afetada ou a onda de protestos por democratização nos países árabes chegar à Arábia Saudita, maior produtor mundial de petróleo. De qualquer maneira, afirmam, o Brasil sentirá os efeitos desse novo cenário, que tende a frear a recuperação econômica global, mas que pode favorecer o financiamento da Petrobras para a exploração do pré-sal.

Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e diretor do Centro de Economia Internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV), acredita que o impacto inicial será ruim para o país, pois a alta nos preços do petróleo - que, segundo ele, continuará até que o Oriente Médio se estabilize politicamente - tende a frear a frágil recuperação econômica dos países ricos, como EUA e Japão, e da União Europeia (UE). Além disso, aumentará a pressão inflacionária em emergentes como Brasil, China, Índia e Rússia, o que exigirá mais da equipe econômica.

- As medidas terão de cortar a gordura da inflação sem afetar o filé mignon do crescimento. O desafio será calibrar as medidas - disse Langoni, acrescentando que, a médio e longo prazos, a crise na maior região produtora de petróleo tende a beneficiar o país. - O Brasil, estável politicamente, tende a ganhar importância no mundo, e muitos países vão tentar que seja antecipada a produção do pré-sal. Isso facilitará a captação de recursos para a Petrobras iniciar a produção no pré-sal, além de manter os preços em um patamar competitivo para a exploração das reservas ultraprofundas. Tenho certeza de que Barack Obama (presidente dos EUA) tratará disso em sua visita ao Brasil.

Bill Belchere, economista-chefe global da Mirae Asset Securities, disse à Bloomberg News que, se os preços do petróleo subirem mais US$20 ou US$30, a economia global pode cair de novo em recessão.

Preços do Brasil não mudam agora

O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, disse ontem que os preços internacionais do petróleo continuarão voláteis a curto prazo. Segundo Gabrielli, o comportamento dos preços depende de dois fatores. De um lado, a demanda na Europa e nos EUA tende a continuar estável. Do outro, está a capacidade de produção dos membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) - que ontem assegurou que o mercado está abastecido.

Segundo Gabrielli, só a Opep tem condições de elevar a curto prazo a produção de petróleo. Ele garantiu que a Petrobras não pretende repassar aos preços internos a volatilidade no mercado externo e continuará acompanhando as cotações a longo prazo. Gabrielli lembrou que, neste momento, o câmbio está favorável para os preços internos de combustíveis.

A estratégia da Petrobras de não repassar a alta de preços tende a prejudicar os acionistas da estatal, segundo Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie). Em sua opinião, a empresa, devido à ingerência política e a uma tentativa de frear a inflação, deve absorver as altas internacionais do petróleo, o que afetará seus resultados.

- Isso é ruim para o acionista e para a própria Petrobras.

Pires lembra que, do ponto de vista da produção de petróleo, a situação da Líbia, maior exportador para a UE, é muito mais grave que a de Tunísia ou Egito, que também enfrentaram protestos recentemente. A Líbia é o primeiro país da Opep sacudido por manifestações. Com isso, Pires acredita que, em breve, a cotação do petróleo poderá passar de US$140:

- Estamos vendo a pressão na alta dos preços, que já era prevista, se antecipar. Muitos imaginavam o barril a US$120 ou US$130 em maio ou junho, mas esse pode ser o novo patamar nos próximos dias - afirmou.

Helder Queiroz Pinto Jr., do Grupo de Economia da Energia da UFRJ, acredita que a alta dos preços ainda antecipa outros problemas. Ele disse que se a onda de protestos chegar à Arábia Saudita, que sozinha exporta 10 milhões de barris por dia, a situação seria "catastrófica". Mas ressaltou que parte da alta é especulativa, pois ainda não há informação de que a produção na Líbia tenha sido afetada.

O ouro também avançou ontem, com investidores buscando aplicações mais seguras. A onça-troy subiu 1,2%, para US$1.408,445. As bolsas de valores americanas não funcionaram por feriado, mas Londres recuou 1,12%, Frankfurt, 1,41%, e Paris, 1,44%. Já Milão caiu 3,59% puxada pela queda de 5,1% da petrolífera italiana Eni.