Título: Ditadura: desaparecimento investigados
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 23/02/2011, O País, p. 15

Para promotor do MP Militar, casos de ativistas de esquerda se comparam a sequestros

STUART ANGEL: lista tem 40 ativistas levados a unidades militares

BRASÍLIA. O Ministério Público Militar do Rio abriu procedimento para investigar os responsáveis pelo desaparecimento de ao menos 40 ativistas de esquerda que foram levados para unidades militares no estado, durante a ditadura. A iniciativa é do promotor Otávio Bravo, para quem é preciso esclarecer os casos de desaparecimento forçado durante o regime militar. O promotor compara esses casos de desaparecimento a sequestros.

Bravo pediu ajuda de entidades como o Tortura Nunca Mais, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. A presidente do Tortura Nunca Mais do Rio, Cecilia Coimbra, encaminhou ontem ao promotor uma relação de 40 nomes de desaparecidos políticos.

Otávio Bravo solicitou também indicação de testemunhas que possam colaborar para esclarecer esses casos. O grupo enviou nomes de parentes de quatro desaparecidos: Mário Alves de Souza Vieira, Rubens Paiva, Carlos Alberto Soares de Freitas e Stuart Angel Jones. Além deles, a investigação do promotor inclui também desaparecidos que passaram por prisões no Espírito Santo, estado que, com o Rio, também faz parte da 1ª Circunscrição Judiciária Militar.

¿ Não tenho a ingenuidade que algum desses sequestros ainda esteja em curso. Evidentemente, não estão. Mas, para dizer que esses crimes estão prescritos e seus responsáveis anistiados, tem que se saber como terminaram. O principal objetivo da ação é esclarecer como isso tudo aconteceu. Se essas pessoas estão mortas, se foram libertadas ou se fugiram ¿ disse Bravo.

Reportagens e depoimentos anexados ao material

No material encaminhado ao promotor, o Tortura Nunca Mais juntou biografias com informações dos desaparecidos, reportagens e declarações e depoimentos de militares e de torturadores.

¿ O gesto do Ministério Público é corajoso e pode ajudar a elucidar e a esclarecer ¿ disse Cecilia Coimbra.

Bravo disse que uma de suas motivações foi a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA de condenar o Brasil por graves violações ao direitos humanos na repressão à Guerrilha do Araguaia, no ano passado. Para justificar a instauração da investigação, o promotor listou, ao todo, 21 razões, entre as quais convenções internacionais assinadas pelo governo brasileiro nessa área. Ele lembrou que sequestro é crime tipificado no Código Penal Militar.

O promotor disse que a tendência é concluir que esses desaparecimentos (ou sequestros) acabaram na década de 70.

¿ Aí, resta um delito, que também não está prescrito de jeito nenhum: a ocultação de cadáver ¿ afirmou. ¿ Ficaria recompensado se encontrasse ao menos um corpo, para dar alento a uma família.

Sobre possível resistência das Forças Armadas, o promotor diz que a expectativa é que os militares são sempre sensíveis e reativos a este tema:

¿ Acho até que é bom para as Forças Armadas uma investigação desse tipo. Ajuda aos bons militares.

O Tortura Nunca Mais sugeriu ao promotor solicitar à Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada à Secretaria de Direitos Humanos do governo federal, informações sobre cada um desses militantes de esquerda.