Título: A Lula, com carinho
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 31/07/2009, Economia, p. 12

Ata do Copom soa como música para o presidente ao prever que taxa básica de juros não deve subir em 2010, período em que ele quer eleger seu sucessor

O economista Elson Teles prevê inflação menor no ano que vem

Para conforto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que quer eleger a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, como sua sucessora, o Banco Central (BC) indicou ontem, na ata do Comitê de Política Monetária (Copom), que a taxa básica de juros (Selic) não subirá em 2010. Na semana passada, Lula, preocupado com a alta dos juros no mercado futuro, afirmou a assessores ¿ um tanto quanto irritado com especuladores ¿ que não permitiria um aumento da taxa básica no ano que vem.

Ao justificar os motivos que permitiram, na semana passada, mais um corte de 0,5 ponto percentual na Selic, de 9,25% para 8,75% ao ano, o BC deixou claro que o atual nível dos juros é compatível ¿com um cenário inflacionário benigno¿ e com a retomada do crescimento econômico. Ressaltou ainda que, pelo menos até 2011, as expectativas de inflação estão ¿consistentes¿ com a meta de 4,5% ao ano.

¿Muita gente do mercado entendeu que o sinal mais importante da ata foi o de que o processo de queda dos juros, iniciado em janeiro deste ano, chegou ao fim. Na minha opinião, porém, o relevante é destacar que os juros não subirão em 2010, ano de eleição, apesar de parte do mercado apostar nessa alta¿, disse o economista-chefe da SLW Asset Management, Carlos Thadeu Filho. Para ele, se houver alguma possibilidade de mudança na Selic, será para baixo, pois, nas suas projeções, a inflação cairá para 3,4% no ano que vem. ¿Mesmo que a atividade interna ganhe um fôlego maior, a fragilidade da economia global tenderá a segurar o aumento dos preços¿, afirmou.

Segundo o economista, o BC está, inclusive, superestimando a inflação de 2010, por apostar em uma alta de 4,3% nos preços administrados (tarifas públicas, principalmente). A seu ver, com os índices gerais de preços (IGPs) fechando este ano com deflação próxima de 1%, dificilmente a correção dos administrados passará dos 2,5% no ano que vem. Como, historicamente, esse grupo responde por 30% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), referência para o sistema de metas do governo, se prevalecer a estimativa do BC, o impacto dos administrados na inflação será de 1,29 ponto percentual. Caso se confirme a estimativa de Thadeu, o peso será de 0,75 ponto. Ou seja, há uma diferença de 0,54 ponto nas duas projeções. Por isso, o BC projeta inflação de 3,9% e o economista, de 3,4%.

Gastos preocupam

Para o economista-chefe da Concórdia Corretora, Elson Teles, há um exagero na estimativa do BC para os preços administrados em 2010. ¿Os 4,3% que estão na ata não vão se confirmar. O número será bem menor e isso impactará favoravelmente a inflação do ano que vem¿, assinalou. Ele destacou que também não vê possibilidade de o Copom (1)mexer na taxa Selic até o fim das eleições. ¿Não é comum um Banco Central aumentar juros em ano de eleições. Se vier um aumento, será depois do segundo turno, caso ocorra. Mas nada substancial, algo como 0,5 ponto, no máximo¿, acrescentou. ¿O importante é que, neste momento, o BC está em uma situação confortável para manter os juros em 8,75% por um bom período, sem pressões inflacionárias.¿

Na avaliação do economista-chefe do Banco BES Investimentos, Jankiel Santos, era previsível que, depois de um corte de cinco pontos percentuais na Selic, que atingiu seu piso histórico, o BC suspendesse esse processo para esperar os reais impactos do forte estímulo na atividade econômica. O Copom, por sinal, ressaltou que o momento atual exige cautela, pois existem incertezas em relação ao ritmo de recuperação da atividade.

O BC também chamou a atenção para os ¿estímulos fiscais¿ (gastos públicos maiores) dados pelo governo em meio à crise mundial. Na visão dos diretores do banco, ¿esses estímulos¿, associados à queda dos juros, ¿devem ser cuidadosamente monitorados ao longo do tempo¿. A preocupação com o aumento dos gastos do governo e com a Selic em patamar tão baixo é tamanha que dois integrantes do Copom cogitaram a possibilidade de os juros não caírem. Prevaleceu, porém, a posição da maioria comandada pelo presidente do BC, Henrique Meirelles, que, dias antes, havia indicado a Lula espaço para um pequeno ajuste na taxa básica.

1 - COPOM O Comitê de Política Monetária (Copom) foi instituído em 20 de junho de 1996, com o objetivo de estabelecer as diretrizes da política monetária e de definir a taxa de juros. A ideia era dar maior transparência e ritual às decisões. Formalmente, os objetivos do Copom são implementar a política monetária, definir a Taxa Selic e seu eventual viés, e analisar o relatório de inflação. As reuniões ordinárias do Copom dividem-se em dois dias: a primeira sessão às terças-feiras e a segunda às quartas-feiras. Mensais desde 2000, o número de reuniões ordinárias foi reduzido para oito ao ano a partir de 2006.