Título: Revolucionários já organizam governo
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 28/02/2011, O Mundo, p. 25

Kadafi perde Zawiya, a 50 quilômetros de Trípoli. Benghazi forma Conselho Nacional

REVOLTOSOS USAM carcaças de carros e barreiras de concreto para impedir avanço das forças leais a Kadafi em Zawiya. Manifestantes da cidade pisoteiam um pôster do ditador (no topo)

ZAWIYA, Líbia. Apenas 50 quilômetros separam agora as forças rebeldes do QG do ditador Muamar Kadafi em Trípoli. Ao fim de vários dias de confrontos, os opositores finalmente dominaram Zawiya, uma cidade de 200 mil habitantes entre a capital do país e a fronteira com a Tunísia. Já em Benghazi, primeiro grande centro urbano perdido pelo ditador, os revoltosos anunciaram a formação de um Conselho Nacional. De acordo com um porta-voz do órgão, ainda não se trata de um governo interino, mas seria o primeiro passo para ordenar o poder nas áreas já libertadas do jugo de Kadafi.

¿ Nossos irmãos em Trípoli dizem que, por enquanto, estão bem e não precisam de ajuda ¿ contou o general Ahmed el-Gatrani, uma das principais figuras do Exército em Benghazi, já rompido com Kadafi. ¿ Se eles nos chamarem, estamos prontos.

O Conselho Nacional já adiantou que não há qualquer espaço para negociação com Kadafi. O órgão tampouco tem ligações com o ex-ministro da Justiça Mohamed Abud Ajleil, que se autointitulou líder de um governo interino em Benghazi. Os rebeldes, no entanto, ressaltaram que o anúncio de Ajleil representa apenas sua ¿visão pessoal¿.

Sitiada, Zawiya prepara-se para novo ataque

Segundo relatos, centenas de rebeldes de Benghazi já estariam marchando para Trípoli. Os revolucionários atacariam a capital pelo leste. Fontes indicaram que tropas foram despachadas para Sirta ¿ cidade-natal de Kadafi, no caminho entre a capital e Benghazi ¿ para tentar barrar qualquer avanço de forças rebeldes rumo a Trípoli. No front oeste, um ataque poderia vir da recém-dominada Zawiya ¿ onde, ontem, os rebeldes ostentavam no alto de um edifício uma bandeira vermelha, verde e branca anterior a Kadafi, adotada como símbolo da rebelião. Os rebeldes comemoraram a queda da cidade atirando para o alto e gritando: ¿Esta é a nossa revolução!¿. Zawiya coleciona marcas da batalha entre manifestantes e governo. Prédios foram queimados e, após dias de tiroteio, era fácil encontrar paredes muito esburacadas. Quase todas as ruas contavam com carcaças de carros.

De acordo com o médico Youssef Mustafa, 24 pessoas foram mortas lutando pela cidade nos últimos três dias. Um estacionamento perto da praça principal teria sido transformado em cemitério.

¿ Precisamos de mais remédios, alimentos e médicos ¿ ressaltou. ¿ Há muitos médicos bons na Líbia, mas eles não conseguem chegar aqui.

Como em outras cidades em poder dos rebeldes, as instituições estatais deram lugar a comitês, que legislam sobre as diversas necessidades locais ¿ da defesa a insumos básicos. A batalha por Zawiya, porém, pode não estar totalmente vencida. Segundo os rebeldes, 2 mil homens leais a Kadafi reorganizam-se na periferia da cidade e atacariam a qualquer momento.

¿ Vamos fazer o melhor possível para afastá-los. Eles atacarão logo ¿ revelou um ex-major da polícia que se juntou aos rebeldes.

Segundo ele, cerca de 2.500 policiais e 400 oficiais desertaram, além de um número desconhecido de militares. Os principais acessos à cidade ganharam barricadas, formadas por blocos de concreto e troncos de palmeiras. Rebeldes com rifles e uniformes improvisados são vistos em todos os postos de controle. Seis tanques e artilharia antiaérea montada em picapes fazem parte das defesas rebeldes, à espera da ofensiva das forças do governo.