Título: Kadafi quer Brasil como observador da crise
Autor: Azevedo , Cristina
Fonte: O Globo, 03/03/2011, O Mundo, p. 30

Rejeitando as acusações de assassinato de opositores, o ditador líbio, Muamar Kadafi, propôs ontem a formação de uma comissão de observadores internacionais formada por Brasil, União Africana (UA) e a Organização da Conferência Islâmica para examinar a crise no país. Num discurso de duas horas e meia a uma plateia de cerca de mil pessoas num hotel de Trípoli - incluindo os chefes dos corpos diplomáticos ainda presentes na capital e jornalistas estrangeiros - Kadafi disse ainda que pretende substituir empresas e bancos ocidentais que atuam no país por outros de Brasil, Rússia e China.

- Ele propôs uma comissão para examinar a situação in loco e citou especificamente o Brasil, a União Africana e a Organização da Conferência Islâmica - contou, por telefone, o embaixador brasileiro em Trípoli, George Ney de Souza Fernandes.

Outros países considerados amigos da Líbia foram citados por Kadafi, como Rússia e China, mas sem mencioná-los para a comissão. Para o embaixador, o convite ao Brasil se deve a sua posição internacional.

- Nossa presença na Líbia é muito forte com as empresas brasileiras. O Brasil é muito respeitado em todo o continente africano - disse o embaixador.

Procurado pelo GLOBO em Brasília, o Itamaraty informou não ter detalhes sobre a proposta de Kadafi e aguarda um comunicado oficial da embaixada em Trípoli para se pronunciar.

Gates: é preciso ataque antes de criar zona de exclusão

A proposta veio num dia em que os Estados Unidos deram um passo atrás diante de qualquer plano de intervir militarmente na Líbia - e arrastaram a comunidade internacional de volta ao campo da retórica. A Liga Árabe rejeitou intervenção estrangeira no país, e o Tribunal Penal Internacional (TPI) em Haia, na Holanda, disse ter provas suficientes para abrir uma investigação formal sobre crimes contra a Humanidade.

"Seguindo o exame preliminar das informações disponíveis, o promotor Luis Moreno-Ocampo chegou à conclusão de que uma investigação é justificada", diz um comunicado da corte.

Em Washington, o senador John Kerry, chefe da Comissão de Relações Exteriores do Senado, defendeu que os EUA estejam prontos para impor uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia e pediu recursos para "a democratização do mundo árabe". Mas, contrariando os apelos por ação, o secretário de Defesa, Robert Gates, optou pela cautela - advertindo que o fechamento dos céus só seria possível após um ataque para destruir a capacidade antiaérea de Kadafi.

Diante das advertências militares, a secretária de Estado, Hillary Clinton, também mudou o tom. Alegando que o maior temor americano é que o caos na Líbia a transforme numa "gigantesca Somália", ela afirmou que os recursos militares poderiam dar apoio logístico "a áreas necessitadas e dispostas a recebê-lo". O processo de criar a polêmica zona de exclusão aérea, advertiu, não será imediato:

- Temos um longo caminho para chegar à decisão.

A Liga Árabe pediu que o governo líbio cesse imediatamente a violência contra os opositores, mas repudiou uma intervenção externa. O secretário-geral Amr Moussa, sugeriu, no entanto, que a zona de exclusão aérea seja criada, mas com a supervisão da liga e da União Africana.

Na contramão de americanos e europeus, o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, reafirmou seu apoio a Kadafi, e o ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Nicolas Maduro, pediu a criação de um bloco de países amigos da Líbia para ajudar a resolver o conflito.

Com agências internacionais