Título: Governo erra no subsídio a investimentos
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Fonte: O Globo, 04/03/2011, Opinião, p. 6

Mais uma vez o BC é obrigado a elevar os juros - outro 0,5 ponto percentual, para 11,75% -, apesar de já praticarmos a mais elevada taxa real do planeta, estimada em 5,9% anuais, bem à frente do segundo colocado, a Austrália, com apenas 2%. Tudo devido ao desregramento nos gastos de custeio praticado nos dois últimos anos do governo Lula, sob o álibi de uma "política anticíclica" para enfrentar os efeitos internos da crise mundial iniciada em fins de 2008, mas mantida por muito mais tempo que o necessário, por erro de avaliação ou oportunismo politico, já que 2010 era ano eleitoral. A taxa de juros no Brasil é muito alta devido a desequilíbrios da economia brasileira, como gastos correntes exagerados e bancos oficiais atuando com juros subsidiados, o que enfraquece as medidas anti-inflação do BC. A elevação da Selic, a taxa básica de juros - como o Copom executou pela segunda vez consecutiva na quarta-feira -, termina sendo em doses exageradas, mas necessárias, devido aos tais desequilíbrios.

Diante deste quadro, as medidas anunciadas para cortar R$50 bilhões do Orçamento parecem modestas. Afinal, o governo continuará a aumentar os gastos correntes, em comparação com o ano anterior.

E o pior, o BNDES receberá uma nova injeção de dinheiro público, esta de R$50 bilhões, para liberar um volume ainda maior de empréstimos com juros subsidiados. Ainda que se vá diminuir o tamanho dos subsídios, este tipo de operação atrapalha a ação do BC.

A justificativa oficial é que se está cortando gastos correntes e mantendo investimentos, através do BNDES. Ora, está se diminuindo apenas a velocidade de expansão dos gastos correntes. E injetando recursos subsidiados com a outra mão. Além de este tipo de manobra aumentar as dúvidas sobre a política fiscal, contribui para manter a demanda aquecida, causa do atual surto de inflação.

O resultado é que o BC continua obrigado a aumentar os juros e, com isso, instala-se um círculo pernicioso, pois nada atrapalha mais os investimentos na economia brasileira do que a Selic elevada! A política anunciada para alavancar os investimentos na verdade conspira contra eles.

Por trás deste erro crasso, está a visão de que o Estado sabe alocar melhor os recursos para investimento do que a iniciativa privada. O que a História tem demonstrado ser uma falácia.

O IBGE confirmou ontem que o PIB cresceu velozmente no ano passado, à taxa de 7,5%, a mais elevada desde 1986 e 2,5 pontos acima da expansão mundial, colocando o Brasil no terceiro posto do ranking planetário, atrás de China (10,3%) e Índia (8,6%). Mas isto é passado, paisagem vista pelo espelho retrovisor. A economia já desacelerava no final do ano, com um crescimento no quarto trimestre de 5% em relação ao mesmo período de 2009. E precisava mesmo começar a desaquecer, devido à inflação e às contas externas.

Importa saber dos investimentos, dos quais depende a expansão futura. No ano passado, a taxa de investimento em relação ao PIB subiu de 16,9% para 18,4%, mas ainda insuficiente para sustentar um crescimento de longo prazo. O futuro, portanto, continua incerto. E ficará assim enquanto não for revista em Brasília a visão anacrônica de que será o Estado o carro-chefe da expansão.