Título: Ventos que balançam os tronos
Autor: Hisham Matar
Fonte: O Globo, 06/03/2011, O Mundo, p. 32

Alvo de clamores de reforma, monarcas do Golfo têm mais margem de manobra

LONDRES. O sultão de Omã, Qaboos al-Said, falou em 50 mil novos postos para o funcionalismo público e num novo seguro-desemprego. Abdullah, o rei da Arábia Saudita, marcou sua volta ao país, depois de um longo tratamento médico no exterior, com o anúncio de um pacote de US$37 bilhões para a previdência social. Nas últimas semanas, tais acessos de generosidade monárquica têm sido praxe nas monarquias do Golfo Pérsico. Nada espontâneo, porém: trata-se de uma reação da realeza diante da constatação de que, ao contrário de crises internacionais anteriores, a recente onda de revoltas no mundo árabe poderá provocar alterações substanciais em seu modo de vida.

Os ventos da revolta já chegaram ao Bahrein, onde houve sérios enfrentamentos entre manifestantes e a polícia, e desde o último fim de semana sopram em Omã. Dois pequenos reinos cuja reputação de estabilidade era comprovada pela realização de uma etapa do Mundial de Fórmula-1 (Bahrein) e por um fluxo turístico de mais de 2 milhões de pessoas por ano em busca de hotéis de luxo junto ao mar (Omã). Mas agora, os dois países se veem envolvidos num turbilhão que analistas consideram ter mais destrutivo.

¿ Antes do início das revoltas no Norte da África, as monarquias do Golfo pareciam inabaláveis. Mas agora cada desafio vai se tornar mais difícil ¿ vaticina o historiador Joshua Teitelbaum, especialista em monarquias.

As dificuldades enfrentadas pelas monarquias árabes, no entanto, até agora têm sido marcadas pela ausência de clamores por mudança de regime. Um reflexo da combinação entre tradição, religiosidade (há monarcas que se dizem descendentes de Maomé) e, sobretudo, o contrato social com que soberanos garantiram sua estabilidade em troca de um comprometimento generoso dos royalties do petróleo com o bem-estar material e social de seus cidadãos.

Em contrapartida, estes são submetidos a uma rotina repressora. Tal fórmula, porém, não é perfeita e esbarra em aspectos dos mais variados. No Bahrein, por exemplo, o ressentimento xiita é muito mais acentuado ¿ o país tem uma economia bem menos robusta que a dos vizinhos mergulhados em petrodólares, e os xiitas acusam o governo sunita de discriminação.

Mesmo a Arábia Saudita se vê às volta com problemas, causados por um crescimento populacional superior à capacidade do governo de comprar a satisfação de seus cidadãos, como é o caso de países ricos em petróleo e com populações muito menores, como os Emirados Árabes e o Qatar. Ontem, a Arábia Saudita alertou que não tolerará manifestações e as reprimirá com rigor.

¿ As monarquias do Golfo terão de se comprometer com mudanças democráticas para sobreviver ¿ adverte Cristopher Davidson, do Centro de Estudos de Oriente Médio da Universidade de Durham, no Reino Unido.