Título: Governo teme risco de mudança abrupta no câmbio
Autor: Gomes, Wagner
Fonte: O Globo, 05/03/2011, Economia, p. 19

Após derretimento do dólar, crise externa poderia reverter cenário. Captações de empresas preocupam

BRASÍLIA. Além de enfatizar que a economia brasileira não está superaquecida, o discurso do governo na repercussão do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pela economia) de 2010 foi calibrado para introduzir a preocupação com o cenário externo e com o comportamento do dólar. Os rescaldos da crise mundial - como a lentidão na retomada do crescimento dos países ricos, incluindo os EUA, e a ameaça de elevação dos juros na União Europeia - atiçaram os temores de uma nova turbulência, com impacto especialmente na taxa de câmbio, que pode subir bruscamente e pegar consumidores e empresas, que vêm se fiando no dólar barato, desprevenidos.

O próprio derretimento contínuo da moeda americana - que hoje caiu abaixo de R$1,65 - reforça o medo de que haja uma mudança de uma hora para outra na cotação, refletindo uma avaliação dos investidores de que o valor chegou a um patamar insustentável. É quando acontece o chamado ajuste das contas externas.

O governo tem grande preocupação com a quantidade de empresas que, aproveitando o bom momento do Brasil lá fora, estão fazendo captações de recursos no exterior. O risco é que uma instabilidade reverta o quadro e acabe provocando um superendividamento em dólar, que as companhias não teriam condições de honrar.

O assunto é tratado com cautela pelos técnicos da área econômica para não criar alarme. Mas as autoridades vêm dando um recado muito claro e o discurso parece afinado em todas as instâncias. Após o anúncio do PIB de 2010, a presidente Dilma Roussef, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, deixaram transparecer que o cenário externo está no radar de preocupações e que uma reversão da taxa de câmbio já não é um cenário tão absurdo.

Na posse dos novos diretores do BC, Tombini afirmou que a crise "ainda está presente no globo". Dilma, por sua vez, disse que o país crescerá entre 4% e 4,5% "se o mundo não criar turbulências nem marolas". Já Mantega afirmou que o câmbio tem mostrado uma certa estabilidade e que "a disparidade está desaparecendo".

- O governo segue atento ao que está acontecendo lá fora - disse um integrante do governo.