Título: Corrida contra o tempo na Líbia
Autor:
Fonte: O Globo, 11/03/2011, Opinião, p. 6

À medida que as forças leais ao coronel Muamar Kadafi recuperam áreas em mãos dos que se rebelaram contra sua ditadura na Líbia, acende-se o sinal amarelo na comunidade internacional. É preciso agir rapidamente para deter o tirano, que não hesita em matar compatriotas para permanecer no poder. A questão é complicada. Kadafi leva sobre os rebeldes a vantagem da superioridade aérea. E quanto mais terreno recuperar, menos militares líbios estarão dispostos a desertar ou a deixar de cumprir suas ordens, temendo por suas vidas e as de suas famílias.

Nos últimos dias, muito se tem discutido a criação de uma zona de exclusão, para neutralizar a superioridade aérea do coronel. Mas o presidente Barack Obama não será um novo Bush. Os EUA, escaldados pela experiência do Iraque, acertadamente recusam dar qualquer passo sem apoio da comunidade internacional. E há problemas no Conselho de Segurança: Rússia e China ameaçam vetar uma proposta nesse sentido.

A França foi mais ousada e se tornou o primeiro país a reconhecer o Conselho Nacional Líbio, órgão máximo dos rebeldes que controlam Benghazi, segunda cidade do país, como legítimo representante do povo líbio. Depois de receber em Paris expoentes do Conselho, o presidente Sarkozy deu declarações favoráveis a uma outra forma de ação: o bombardeio seletivo de alvos militares do regime de Kadafi. A França, ao lado da Grã-Bretanha, lidera a ofensiva para enfraquecer o governo de Trípoli.

A Otan, reticente na questão da zona de exclusão, agiu para monitorar o espaço aéreo líbio 24 horas por dia, mobilizando aviões Awacs. Os EUA, junto com outros países, já congelaram bilhões de dólares em ativos do regime líbio. Mas o alcance da medida é limitado, pois Kadafi dispõe de reservas no BC líbio, que ele controla, e em outros bancos em Trípoli, com as quais pode pagar os mercenários contratados para fazer frente aos rebeldes.

Washington tenta elevar a pressão sobre o ditador e ontem anunciou que a secretária de Estado, Hillary Clinton, vai se avistar com os líderes rebeldes nos EUA e durante sua viagem na próxima semana a França, Tunísia e Egito. Há muita tensão na comunidade internacional porque Kadafi segue usando bombardeios aéreos, navais e de artilharia contra oponentes. É preciso detê-lo.

Amanhã, haverá uma importante reunião da Liga Árabe sobre a situação na Líbia. A torcida é para que a organização, até aqui dominada pelos ditadores do Oriente Médio, se conecte aos ventos democráticos na região, que já derrubaram dois longevos tiranos, na Tunísia e no Egito, e adote sanções contra Kadafi. A União Europeia já adiantou que, se a Liga considerar legítimo o movimento contra o coronel, ela também poderá reconhecer o Conselho Nacional Líbio, o governo rebelde. Isto o deixaria ainda mais isolado.

O Conselho dos Países do Golfo abriu o precedente ao considerar que o regime do ditador perdeu a legitimidade, e exortar a Liga Árabe a tomar medidas para impedir um banho de sangue na Líbia, inclusive com a adoção da zona de exclusão aérea. Se os países árabes seguirem o conselho, o Oriente Médio provará que está mudando, para melhor.