Título: Líbia ameaça ofensiva final em dia de vitórias
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Fonte: O Globo, 11/03/2011, O Mundo, p. 28

TRÍPOLI. O governo de Muamar Kadafi afirmou ontem estar pronto para lançar uma ofensiva total contra os rebeldes, enquanto suas tropas faziam os revoltosos recuarem de Ras Lanuf, no leste, e derrotavam as forças opositoras que há dias resistiam em Zawiya, no oeste, conquistando duas cidades estratégicas para a produção e exportação de petróleo do país. As ações, que pela primeira vez empregaram tanques e aviões combinados com navios da Marinha e embarcações de carga armadas, sugerem que a ofensiva anunciada pode estar começando.

¿ É a hora da libertação. É hora de agir. Estamos nos movendo ¿ disse Saif al-Islam, um dos filhos de Kadafi, num complexo em forma de tenda, em Trípoli. ¿ Eu tenho duas palavras para nossos irmãos e irmãs do leste: estamos chegando.

Segundo Saif, o tempo de negociar se esgotou. Educado em Londres, ele usou um tom mais ameaçador do que o habitual. Ele afirmou que o pai não se renderá mesmo que haja intervenção externa e disse que era "tarde demais" para "as gangues".

¿ Não temos medo nem da frota americana, nem da Otan, nem da França ¿ disse Saif. ¿ A Líbia não é uma fatia de bolo. Enquanto ele falava, Ras Lanuf sofria um de seus piores ataques até o momento, com os tanques de Kadafi chegando ao ponto mais oriental do país desde que o leste caiu em mãos rebeldes. Aviões e navios completaram a ofensiva, que atingiu uma área residencial, causando dezenas de mortes. Alvejado, um hospital teve que ser evacuado. Uma mesquita e um complexo de gás natural também foram atingidos. Os rebeldes dispararam artilharia antiaérea contra os aviões e foguetes em direção ao mar, sem sucesso.

Sob uma chuva de bombas e morteiros, os rebeldes acabaram subindo em picapes e saírem em disparada em direção leste. E embora o governo afirme que tomou completamente Ras Lanuf, a oposição desmentiu o fato ontem à noite.

Corpos enterrados na Praça dos Mártires Os aviões do governo bombardearam ainda Brega, outro porto no leste, enquanto a TV estatal dizia que o porto e o aeroporto de Sidra haviam sido retomados por Kadafi. Pelo segundo dia consecutivo, os rebeldes tentaram atacar Bin Jawad, mas foram rechaçados ¿ desta vez, com disparos de navios.

Tanques e aviões foram enviados para atacar Zawiya, a 50 quilômetros de Trípoli e que há dias vivia um cabo de guerra entre os dois lados. Embora os rebeldes tenham perdido e recuperado a praça principal ontem, o governo acabou por retomar a cidade. Jornalistas britânicos que entraram em Zawiya relatavam um cenário devastador, com prédios destruídos e corpos enterrados na Praça dos Mártires: sem poder removê-los para um cemitério durante os dias de confrontos, muitos optaram por enterrá-los ali mesmo. Um morador disse que pelo menos 150 pessoas morreram. E mesmo com o fim da batalha, disparos eram ouvidos ao longe, contou a repórter do "Times".

O "Guardian", um dos primeiros a chegar, relatou uma "operação limpeza" do governo, removendo do chão as marcas da luta, enquanto revistas eram feitas de casa em casa. Moradores contaram que muitos estão sendo presos. Nas ruas, os poucos que apareciam agitavam bandeiras verdes e gritavam: ¿ Há apenas Deus, Muamar e a Líbia.

Outra cidade cercada, Misurata, vive uma situação dramática. Médicos reclamam da falta de medicamentos e de material para o tratamento de pessoas com diabetes e que precisam de hemodiálise, que podem custar a vida de 300 pacientes.