Título: De metrópole a cidade fantasma
Autor: Sarmento, Claudia
Fonte: O Globo, 13/03/2011, O Mundo, p. 34

Réplicas sentidas em Tóquio esvaziam ruas das capital

TÓQUIO. A madrugada de sábado foi marcada por cenas de pesadelo em Tóquio, com milhares de pessoas caminhando por horas no escuro em direção às suas casas, diante do colapso do sistema de transportes. Mas ao longo do dia, à medida em que as linhas de trem eram restabelecidas, as ruas foram se esvaziando. A capital, com 13 milhões de habitantes, sempre lotada e colorida, foi mergulhando no silêncio. Ontem à noite, o caminho entre o aeroporto de Haneda e o centro ¿ em geral, engarrafado ¿ parecia uma cidade fantasma.

Segundo o governo de Tóquio, 94 mil pessoas buscaram abrigo em mil estabelecimentos públicos para passar a noite de sexta para sábado. Os tremores de terra ainda são uma ameaça e o melhor a fazer no fim de semana é ficar em casa. Por volta das 22h15m de ontem, o abalo de seis graus que voltou a sacudir a província de Fukushima, onde a usina nuclear se transformou em foco de atenção mundial, foi sentido em Tóquio. Muitas outras réplicas também atingiram a capital. Os moradores parecem assustados e exaustos, mas continuam reagindo de maneira contida e ordeira. Algumas atitudes são surpreendentemente serenas, mesmo para quem já está acostumado com as maneiras educadas da maioria dos japoneses.

Para quem estava no exterior, a tentativa de voltar ao Japão ontem foi cansativa, mas sem cenas de desespero. No aeroporto de Hong Kong, filas imensas e voos lotados exigiam muita paciência e, apesar de aflitos, grudados em seus celulares, era exatamente isso o que os japoneses demonstravam. Não havia os tradicionais bate-boca que dominam a relação de passageiros estressados e funcionárias antipáticas de companhias aéreas em momentos de caos. A viagem entre Hong Kong e Tóquio, relativamente rápida, acabou durando mais de dez horas, entre espera em aeroportos e conexões, mas ainda assim as comissárias japonesas sorriam para todo mundo e serviam chá verde no avião, tentando tranquilizar as pessoas.

Dá para imaginar, no final da noite de um dia exaustivo, uma mocinha impecavelmente penteada e maquiada, funcionária do aeroporto de Osaka, correndo ao lado de uma passageira estrangeira para que ela achasse uma companhia aérea que ainda vendesse passagens para Tóquio e, depois, encontrasse o portão de embarque, tudo isso em 15 minutos? Pois é. Aconteceu ontem.