Título: Governo engaveta regulamentação de lobby
Autor:
Fonte: O Globo, 14/03/2011, O País, p. 5

BRASÍLIA. Dois projetos essenciais para ampliar a transparência dos gastos e da gestão pública adormecem em gavetas da Casa Civil da Presidência da República e do Congresso, sem que haja qualquer aceno político de que serão debatidos no primeiro ano do mandato de Dilma Rousseff. No governo, a regulamentação do lobby está longe de um consenso e não figura em nenhuma lista de prioridades entre os temas que devem ser levados ao Congresso. Já no Senado, os parlamentares foram tão cuidadosos, que a Lei de Acesso à Informação terá que passar, separadamente, por três comissões, antes de chegar ao plenário da Casa.

A lei para regulamentar o lobby como atividade profissional ganhou corpo em 2009, depois que a Controladoria Geral da União (CGU) elaborou anteprojeto sobre o tema. O texto, cujo conteúdo ainda não foi referendado pelo Planalto, prevê cadastramento de lobistas pela própria CGU. Já os profissionais que atuarem no Congresso deverão ser credenciados pelas direções de Câmara e Senado. O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), foi categórico ao comentar sobre a viabilidade da proposta:

- Temos muitos outros assuntos com prioridade. Para cada votação como essa, tenho que parar tudo. Não posso parar tudo para discutir isso - afirmou o líder do governo.

"Regulamentado, o lobista terá que andar de crachá"

O controlador-geral da União, Jorge Hage, afirma que a regulamentação do lobby é a única fórmula capaz de permitir que a sociedade conheça quais forças atuam sobre as autoridades públicas, do Executivo ou do Legislativo. E pondera que não é razoável imaginar que o lobby seja uma atividade atípica em regimes democráticos:

- O lobby existe e ninguém tem dúvida disso. A diferença é que, regulamentado, o lobista terá que andar de crachá e todo mundo vai saber qual interesse ele representa. A regulamentação da atividade de lobby contribui para distinguir o lobby legítimo do criminoso.

Além do credenciamento dos lobistas, a regulamentação prevê que os profissionais façam relatos anuais, apresentando os custos das atividades à administração federal e indicando sua natureza. Se não apresentarem o relatório, o cadastro não poderá ser renovado. Outra inovação é a obrigatoriedade de os agentes públicos receberem, quando solicitados, manifestação da parte contrária à do lobista.

O diretor-executivo da Transparência Brasil, Claudio Abramo, diz que o texto é enxuto e simples. Portanto, em sua análise, não há motivos para polêmica:

- Se alguém tem resistência ao cadastro dos lobistas, é porque tem algum motivo. É porque tem algo a esconder.

No caso da Lei de Acesso à Informação, para divulgação de dados públicos, só a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado já analisou o texto. Ele ainda precisa passar pelas comissões de Ciência e Tecnologia, Direitos Humanos e de Relações Exteriores, antes de ir ao plenário. Recém-empossado na presidência da Comissão de Ciência e Tecnologia, o senador Eduardo Braga (PMDB-AM) apresentou extensa lista de prioridades, mas sequer cita a Lei de Acesso à Informação.

O relator do projeto na CCJ, senador Demóstenes Torres (DEM-GO), diz que o governo, autor da proposta, já deu sinais de que não tem interesse na rápida tramitação. As maiores resistências estão entre os militares, temerosos quanto à possível abertura de documentos da ditadura, e entre os diplomatas, que se assustam com a eventual revelação de dados que possam ferir a soberania do país.

- Tanto o governo não tem interesse (na rápida tramitação), que não houve pedido de urgência aqui no Senado, e nem há um movimento para negociar a análise do texto pelas três comissões, ao mesmo tempo - afirmou Torres.