Título: Combustível do lobby
Autor: Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 25/07/2009, Política, p. 2

Base aliada ameaça governo com retaliação na votação de projetos caso as emendas parlamentares continuem travadas. Traição teria impacto bilionário. Arantes, líder do PTB: ¿Não seguro mais a minha bancada. A emenda é a gasolina do parlamentar¿

Não bastasse a crise do Senado, o governo Luiz Inácio Lula da Silva corre o risco de enfrentar uma rebelião da base aliada na Câmara na volta do recesso, em agosto. Deputados governistas estão irritados com o ritmo de pagamento das emendas parlamentares. Dos R$ 5,9 bilhões previstos no Orçamento da União de 2009, o governo só pagou R$ 4,4 milhões. O valor corresponde a menos da metade do que cada congressista teve direito de incluir em emendas individuais na lei orçamentária atual (R$ 10 milhões). Num ano pré-eleitoral, aliados ameaçam retaliar o governo na votação de projetos que teriam impacto bilionário para os cofres públicos.

¿Acendemos a luz amarela¿, afirmou o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), para quem o governo não tem dado ¿ouvidos aos parlamentares¿. Segundo a assessoria técnica do DEM, os 98 deputados e 19 senadores do PMDB, dono das maiores bancadas da Câmara e do Senado, só receberam R$ 350 mil em emendas. O peemedebista disse que, desde maio, o governo tem prometido liberar essa verba ou, pelo menos, os empenhos ¿ compromisso de que o Executivo vai pagá-las no futuro. De janeiro a junho, os empenhos chegaram a apenas R$ 29 milhões. Alves afirmou que a situação não mudou nos últimos dias.

¿Não seguro mais a minha bancada¿, afirmou o líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO). ¿A emenda é a gasolina do parlamentar¿, acrescentou o petebista. Os 30 parlamentares do partido receberam, no primeiro semestre, R$ 450 mil em emendas. Até junho, os 90 petistas do Congresso não tinham recebido qualquer recurso por meio de emenda. Curiosamente, partidos de oposição estão entre os campeões na execução dessa verba. Em primeiro lugar, o DEM, com R$ 1,75 milhão e, em terceiro, o PSDB, com R$ 650 mil.

Na volta do recesso parlamentar, o governo deve enfrentar três importantes votações na Câmara. A primeira é um projeto do senador Paulo Paim (PT-RS) que extingue o fator previdenciário para as aposentadorias pagas pela União. Por causa do fator, o empregado tem de ficar mais tempo na ativa sob pena de perder parte dos vencimentos quando se aposenta. O segundo projeto, também de Paim, garante o reajuste às aposentadorias e pensões superiores a um salário mínimo. Atualmente, quem ganha acima desse valor só recebe o reajuste com base na inflação do ano anterior. Em 2007, Lula vetou uma emenda com o mesmo teor. O veto, que teria impacto na ocasião de R$ 10 bilhões, está na pauta do Congresso para ser analisado após o recesso. Os parlamentares podem derrubar o veto de Lula.

¿Está faltando intenção do governo em atender os parlamentares, ainda mais em ano pré-eleitoral¿, afirmou Jovair Arantes. ¿Estamos sendo desrespeitados¿, completou Henrique Eduardo. Um dos porta-vozes do governo no quesito das emendas, o líder do PT, Cândido Vaccarezza (SP), disse que tem conversado com os ministros do Planejamento, Paulo Bernardo, da Fazenda, Guido Mantega, e de Relações Institucionais, José Múcio, para liberar as verbas. Paulo Bernardo se comprometeu a empenhar, pelo menos, R$ 2,8 bilhões até o fim do ano. ¿Vamos equacionar esse problema¿, promete Vaccarezza, líder cuja bancada também está de pires na mão. ¿O Congresso não pode trabalhar dessa maneira, na base da chantagem¿, critica o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO).

Restos para gastar A baixa execução das emendas individuais levou o Executivo a investir nos chamados ¿restos a pagar¿ para acalmar os parlamentares. Essa rubrica diz respeito a verbas que o governo se comprometeu a gastar nos anos anteriores, mas, como não foram usadas a tempo, acabaram inscritas nos orçamentos subsequentes. Dos R$ 769,5 milhões gastos com parlamentares em 2009, R$ 727,4 milhões são de restos a pagar dos últimos três anos. O PT e o PMDB são os principais contemplados. Para ter direito à rubrica, contudo, os parlamentares precisam incluir no fim do ano sua emenda como ¿resto a pagar¿ no orçamento do ano seguinte. ¿Temos que aprovar um orçamento impositivo para acabar com o pagamento das emendas sujeito ao humor do Executivo¿, afirmou Ronaldo Caiado.

Previsão

Cada parlamentar tem o direito de prever o gasto de R$ 10 milhões em emendas individuais. Elas podem ser repartidas em até 25 subemendas para realização de obras públicas. Em 2003, primeiro ano do governo Lula, esse valor era de R$ 2 mi ¿ um aumento de 500%. Em 2010, ano eleitoral, deputados e senadores só podem dispor de emendas até o meio do ano.