Título: Famílias de brasileiros são resgatadas
Autor: Marinho, Antônio; Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 22/03/2011, O Mundo, p. 31

Missões do consulado encontram decasséguis dias após a tragédia no Japão

TÓQUIO. A crise nuclear na usina de Fukushima monopolizou a atenção do mundo, mas as histórias de quem saiu com vida do litoral do Nordeste do Japão também simbolizam o sofrimento de um país que ainda levará muito tempo para se recuperar. Seis pessoas de uma mesma família, chefiada pelo brasileiro Ilton Hanashiro, foram encontradas no último fim de semana por uma missão enviada pelo consulado do Brasil à região arrasada por duas catástrofes naturais - terremoto e tsunami. Já estão em Saitama, nas proximidades de Tóquio, ainda abalados e tentando decidir o futuro. Perderam tudo. A cidade dos Hanashiro, Onagawa, com 11 mil habitantes, desapareceu, levada pela onda gigante. Metade da população morreu.

- É impossível descrever a situação naquela região, de difícil acesso. Não sobrou nada. Foi uma sorte encontrar os Hanashiro - contou a vice-cônsul Marcela Barbosa, que esteve nas províncias de Fukushima e Miyagi.

Hanashiro, que trabalha como operário, estava sem comunicação com o mundo. Passou o primeiro dia após a tragédia na neve, numa montanha, para escapar da inundação, até chegar a um ginásio transformado em abrigo, onde estão mais de 2,3 mil pessoas. Quando um jornalista japonês conseguiu entrar na cidade, Hanashiro pediu que ligasse para a filha, que mora em Santa Catarina. Só então ela pôde procurar o consulado, em Tóquio, e pedir ajuda para a família, que não estava nem na lista de desaparecidos. Durante uma semana, o brasileiro repetiu a mesma rotina: ficava horas na porta do ginásio, acreditando que alguém falando português acabaria aparecendo.

- Quando ele me viu, me abraçou sem falar nada e chorou muito - contou o empresário Walter Saito, brasileiro que foi como voluntário na missão do consulado, e se enrolou numa bandeira do Brasil para facilitar o contato com os imigrantes decasséguis. - Os abrigos estão lotados, as listas de brasileiros são incompletas e achei que a bandeira do Brasil seria um sinal importante, para chamar a atenção - contou ele.

Quatro dias a pão e água, dormindo num mercado

Dez pessoas foram resgatadas e levadas para Saitama. Outros brasileiros encontrados preferiram ficar na área de Sendai, por terem parentes japoneses. Na cidade de Ishinomaki, mais uma família foi achada: Shigeru Shinoyama, de 73 anos, e sua mulher, de 65. Os aposentados estavam num mercado quando a tragédia ocorreu e ficaram quatro dias dormindo ali, comendo pão e água, dividido entre um grupo grande, sem saber para onde ir. Foram ajudados por uma japonesa, ex-colega de fábrica, que os encaminhou a um abrigo e deu a eles uma sacola de comida. Ainda muito abalados, os dois não queriam conversar ontem, pediram para descansar, mas sua filha, Erica, em Saitama, disse que estão bem.

- Não sobrou nada do que eles tinham, mas ganharam a vida. Demorei cinco dias para saber se estavam vivos. É uma angústia que só quem sentiu pode entender - relatou Erica, trabalhadora de uma montadora.