Título: STF pode fazer uma limpeza já na política
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Fonte: O Globo, 23/03/2011, Opinião, p. 6

A posse do 11º ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, tornou possível, salvo mudanças de última hora na agenda da Corte ou algum pedido de vista, superar-se hoje o impasse em torno da aplicação da Lei da Ficha Limpa, crucial para se erguer, já, um marco no processo de faxina ética na vida pública.

Com a aposentadoria do ministro Eros Grau, o que era uma possibilidade aritmética - o empate na Corte em cinco votos - travou, nas eleições de 2010, uma decisão fundamental: se os fichas-sujas, considerados como tais pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), poderiam ou não assumir, impedidos pela Lei da Ficha Limpa, aprovada numa tramitação recorde no Congresso, depois de uma ampla e histórica mobilização popular, dentro dos limites constitucionais.

No entender do TSE, estes políticos estariam alijados dos cargos eletivos, embora a lei tivesse sido aprovada depois de esgotado o prazo legal para alterações de legislação com vistas às eleições de 2010. A Corte aceitou a tese de que a Ficha Limpa não se constituiu uma mudança nas regras eleitorais, apenas estabeleceu normas adicionais de enquadramento dos candidatos. Ou seja, não ter sido condenado em processos por malfeitos administrativos, e por câmara colegiada, nem por outros crimes em segunda instância, também por mais de um magistrado. Foi, ainda, garantido direito de recurso ao condenado à última instância, onde o processo terá prioridade no julgamento.

Com o impasse no Supremo, configurado nos empates sobre recursos dos impugnados Joaquim Roriz e Jader Barbalho - o primeiro renunciou à candidatura ao governo de Brasília; para o segundo, diante do empate, ficou valendo a decisão do TSE contra a candidatura dele ao Senado pelo Pará -, a fixação de parâmetros éticos mínimos na política ficou em suspenso. E assim notórios fichas-sujas puderam tomar posse na atual legislatura.

Há esperança que hoje a Justiça confirme o fechamento do espaço da vida pública para donos de prontuários de todo tipo. A luta para se qualificar a representatividade política tem sido longa. Em eleições anteriores, tribunais regionais tentaram fazer valer a exigência constitucional de uma vida ilibada para ocupantes de cargos eletivos, independentemente de sentenças judiciais definidas em última instância.

O conceito, também constitucional, da presunção da inocência até sentença transitada em julgado derrubou todas as condenações decididas em primeira instância. Milicianos, homicidas condenados em instância inicial, corruptos comprovados, etc. continuaram a se resguardar sob a blindagem da imunidade parlamentar.

A aprovação da Lei da Ficha Limpa superou este obstáculo constitucional, mas ficou por se decidir o momento em que a nova legislação produzirá efeitos. A política brasileira está repleta de absurdos que justificam o Supremo, em sua maioria, no julgamento de hoje, do recurso do deputado estadual mineiro Leonídio Bouças(PMDB), condenado por improbidade administrativa, decidir a favor de a Ficha Limpa revogar a posse de fichas-sujas vitoriosos em 2010.

A tese tem tanta sustentação jurídica que já recebeu o apoio de cinco magistrados do STF. Falta um.