Título: ONU deve discutir brechas em resolução
Autor: Godoy, Fernanda
Fonte: O Globo, 24/03/2011, O Mundo, p. 29

Invasão terrestre e fornecimento de armas a rebeldes são temas de que Conselho de Segurança pode tratar hoje REBELDES DESCARREGAM foguetes de um veículo militar em Ajdabiya: forças pró-Kadafi já cercam a cidade, um dos bastiões da oposição NOVA YORK. O Conselho de Segurança da ONU volta a se reunir hoje para tratar da operação militar na Líbia, em meio a um mar de dúvidas e indefinições sobre o comando e os limites da ação. O fornecimento de armamento aos rebeldes, com base em brechas legais no texto sobre embargo de venda de armas, e até o envio de tropas terrestres são opções que podem ser postas na mesa por alguns dos países, já que o texto da resolução aprovada há uma semana exclui apenas uma "força de ocupação estrangeira". O mesmo parágrafo quarto, o mais polêmico da resolução, é o que autoriza o uso de "todas as medidas necessárias" para a proteção dos civis, e ao menos um país dentre os líderes da coalizão considera possível a entrada de tropas. O texto excluiu apenas a ocupação permanente ¿ por exigência de países que estão na linha de frente da operação e queriam garantia de poder entrar, por exemplo, para resgatar seus pilotos em caso de aviões serem abatidos. Assim como na Otan, reina a confusão na ONU sobre quem controla a operação militar. Os 12 países que já assumiram um compromisso, notificando o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon ¿ que supostamente está na coordenação das operações ¿ ainda não explicaram se agem individualmente ou em conjunto (ambas as formas são autorizadas pela resolução). No sábado à noite, o governo francês decidiu unilateralmente bombardear as tropas do governo Kadafi ao receber informações de que elas já se encontravam nos subúrbios de Benghazi e de que o bastião dos rebeldes estava prestes a cair. Turquia, um revés na Otan A costura dessa coordenação continua extremamente complicada, porque os países árabes não aceitam o comando da Otan. Outro ponto sensível é como integrar a Turquia. Muçulmano e sede da base sul da Otan, em Ismir ¿ de onde a operação deveria ser lançada ¿ o país tem grande resistência em participar da ação. E os italianos, cujas bases já estão em uso, querem a cobertura da bandeira da Otan por temer retaliações dos líbios. Os membros do Conselho de Segurança também devem discutir as exceções à zona de exclusão aérea para voos de missões humanitárias ou de retirada de estrangeiros. No domingo, houve um incidente diplomático porque uma delegação da União Africana queria ir a Trípoli negociar com Kadafi, mas foi impedida de entrar no país. Outro ponto muito polêmico é o embargo da venda de armas à Líbia, que já constava na resolução de 26 de fevereiro e foi reforçado na semana passada. A embaixadora dos EUA junto à ONU, Susan Rice, disse na sexta-feira passada que uma leitura atenta encontraria brechas no texto. O embaixador do Reino Unido, Mark Lyall Grant, disse que o caso estava em análise pela Advocacia Geral de seu país, mas o parecer final não foi divulgado. O entendimento da diplomacia britânica é o de que pode haver exceções ao embargo. O congelamento dos bens de Kadafi, de seus parentes e auxiliares, e de empresas estatais líbias é o último ponto confuso. O texto da resolução diz que eles deverão estar à disposição do povo líbio, num "estágio posterior" e que a liberação será feita tão logo possível. Essa redação tão ambígua serviu para conter os ímpetos dos que queriam liberar imediatamente os recursos de Kadafi para os rebeldes e, ao mesmo tempo, para proteger a reputação da ONU no caso de um escândalo de desvio de recursos. Protestos na Síria deixam 15 mortos MANIFESTANTES FAZEM o sinal da vitória atrás de pneus queimados em Deraa: protesto convocado para amanhã DERAA, Síria. O pesado ataque da polícia síria contra manifestantes em Deraa, no sul do país, deixou pelo menos 15 mortos, numa operação que durou quase 24 horas, contaram ativistas de direitos humanos. Inspiradas no movimento pró-democracia que atinge o mundo árabe, as manifestações em Deraa são vistas como um dos maiores desafios ao governo sírio desde os anos 70, um dos mais repressivos da região. O ataque à mesquita de al-Omari, onde houve a maior parte das mortes, começou na tarde de terça-feira, com centenas de policiais e soldados cercando o templo, e deixou seis mortos em suas primeiras horas. Ativistas de direitos humanos contaram que mais três pessoas foram mortas após o anoitecer, no centro da cidade. Outros seis corpos foram encontrados ontem. Entre eles, o de uma menina de 12 anos, na calçada da mesquita. Desde o início dos protestos, já são 22 vítimas. Mesmo com a crescente repressão, moradores de Inkhil, Jasim, Khirbet Ghazaleh e al-Harrah tentaram chegar ontem a Deraa, mas foram repelidos ao se aproximarem da cidade. Não se sabe se houve vítimas, pois os telefones foram cortados. A TV estatal, por sua vez, disse que a polícia matou quatro homens que teriam tentado atacar uma ambulância. O governo negou um massacre na mesquita, mas a TV mostrou armas que teriam sido apreendidas nela. Deraa é uma cidade próxima à fronteira com a Jordânia e que costuma apoiar o Partido Baath, do presidente Bashar al-Assad. Para o sírio Murhaf Jouejati, especialista da Universidade George Washington, nos EUA, o fato de haver protestos na cidade "significa que o partido está com problemas". Os ativistas estão convocando manifestações para amanhã, no que estão chamando de Sexta-feira da Dignidade. Censura e prisão no Iêmen SANAA. Grupos de oposição no Iêmen estão convocando protestos para amanhã contra Ali Abdullah Saleh. A passeata é uma resposta às medidas de emergência aprovadas ontem pelo Parlamento, dando poderes especiais ao presidente. O decreto valerá por 30 dias e suspende a Constituição, permitindo a censura à imprensa, poderes para violar a correspondência, grampear telefones, fazer buscas em casas e prender suspeitos sem ordem judicial. ¿ Vamos até onde você está e vamos removê-lo ¿ disse o porta-voz da oposição, Mohamed Qahtan, à TV al-Jazeera. Mais cedo, Saleh havia proposto deixar o cargo no fim do ano, oferta que foi recusada pela oposição. A adoção de medidas de emergência, no entanto, demonstra que pretende reprimir os protestos. Egito: punição para grevistas CAIRO. Já o gabinete egípcio propôs um projeto de lei que torna crime alguns tipos de protestos, com punições para manifestantes que façam greve ou destruam propriedades. As penas podem ir de prisão a multas de até US$84 mil. O projeto foi enviado ao Conselho Militar que controla o país desde a saída de Hosni Mubarak, em fevereiro. A medida reflete o temor dos governantes de que as manifestações afetem a economia do país. Mas muitos criticaram o projeto, dizendo que limitaria o tipo de ativismo que derrubou Mubarak. Por outro lado, um promotor público está processando o ex-ministro do Interior Habib el-Adly (já preso por corrupção) e outros membros do governo por contribuírem para o assassinato de manifestantes. Esta é a primeira medida do governo militar para investigar as mortes de cerca de 300 pessoas. Bahrein suspende voos MANAMA. Sem dar explicações, o Bahrein suspendeu os voos para o Líbano. A medida veio um dia depois de advertir seus cidadãos a não viajarem ao país e após declarações do grupo Hezbollah em apoio aos protestos de xiitas bareinitas. Não foi uma medida isolada. Os voos da Gulf Air para o Irã e o Iraque também foram suspensos até o dia 31. A decisão mostra a crescente tensão entre países com governos sunitas e o Irã, xiita. Teerã criticara a intervenção de países sunitas no Bahrein ¿ mesma posição adotada por clérigos xiitas iraquianos.