Título: Ingerência política é maior temor do mercado
Autor: Carneiro, Lucianne ; Rodrigues, Lino
Fonte: O Globo, 26/03/2011, Economia, p. 31

RIO e SÃO PAULO

O risco de influência política na estratégia de atuação da Vale é a maior preocupação do mercado com a troca no comando da mineradora. A questão agora é saber qual será o perfil do substituto de Roger Agnelli à frente da Vale. Alguns analistas acreditam que, apesar da transição tumultuada, os controladores vão escolher um profissional com experiência, enquanto outros temem a opção por um nome político, que acabe comprometendo a busca da empresa por resultados.

¿ Agnelli comandou uma gestão arrojada, com muitas vitórias. O maior estresse (do mercado) é a influência política, se o novo presidente vai operar para o governo ou para os acionistas. Muitos interesses podem não necessariamente coincidir ¿ disse um analista, que pediu para não ser identificado. Apesar da transição traumática, este analista não acredita que os controladores escolherão uma indicação apenas política para substituir Agnelli:

¿ A maior dificuldade será encontrar uma pessoa à altura do Agnelli. Mas, no final, os controladores vão tentar eliminar esse viés político.

Na avaliação da Planner Corretora, a preocupação é que o curso da empresa não seja modificado por uma troca no comando. A questão do mercado é a incerteza sobre quem vai entrar no lugar de Agnelli e se a estratégia de atuação ¿ que tem gerado bons resultados ¿ será mantida. Até por causa do interesse de controladores como a Bradespar, não é considerada grande a chance de escolha de um nome com perfil político para o comando da empresa.

Já para o analista da Win Trade José Goes, a substituição de Agnelli na presidência da Vale é uma indicação de que a empresa ficará mais alinhada à política do governo.

Foco de atuação pode deixar de ser apenas o resultado

Ele cita os rumores da entrada da Vale no consórcio de Belo Monte, no lugar do Grupo Bertin, como a primeira ¿atitude mais política¿ de uma gestão próxima dos desejos da área econômica do governo. ¿ Com a saída de Agnelli, o governo vai acabar tendo um pouco mais de poder na definição dos investimentos da Vale, que ficarão mais políticos ¿ disse Goes, lembrando que o novo presidente terá que ser experiente e com um conhecimento da empresa.

Para Evaldo Alves, professor de economia internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV), na queda de braço entre o Bradesco e o governo, acabou prevalecendo a visão oficial de que é hora de usar politicamente a força da Vale no mercado internacional. Segundo ele, o foco da Vale deixa de ser a busca única e exclusiva pelo melhor resultado, maior lucro (algo que interessava ao Bradesco e outros acionistas), e passa para uma atuação voltada para os interesses do país. Alves ressalta que o cargo de presidente de uma companhia do porte da Vale não pode ser ¿uma experiência política¿.