Título: Em Goiás, contratos sob suspeita
Autor: Maltchik , Roberto
Fonte: O Globo, 28/03/2011, O País, p. 3

APARECIDA DE GOIÂNIA (GO). Quando não há fiscalização, os milionários contratos de serviços de saúde, pagos em parte com verba federal do SUS, ficam numa caixa-preta, aparentemente inacessíveis até ao secretário de Saúde. É o que ocorre em Aparecida, na região metropolitana de Goiânia, onde 77% da população de quase 500 mil habitantes não têm atendimento básico de saúde. A prefeitura conta só com um prestador de serviço e uma organização social, cujos contratos sequer foram apresentados ao Conselho Municipal de Saúde (CMS). As despesas anuais são orçadas em quase R$13 milhões.

Os contratos mais vultosos e que já levantaram suspeitas no Ministério Público foram fechados com o Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Humano (Idtech), criado em 2005 e que teve como patrono na Câmara de Vereadores de Aparecida o então vereador Francisco Júnior (PMDB), do mesmo partido do prefeito de Aparecida, o ex-senador Maguito Vilela (PMDB).

Conselho de Saúde espera informações há um ano

Há mais de um ano, o CMS formalizou pedidos para ter acesso aos documentos e discutir o serviço prestado. Semana passada, o CMS discutiria o tema, mas o Idtech não participou.

- Se continuarem assim, pediremos a suspensão dos pagamentos - diz o presidente do CMS, Fábio dos Reis Fonseca.

O mais intrigante é que o Idtech e o secretário de Saúde, Rafael Nakamura, dizem que não há o que esconder e que o serviço está sendo prestado normalmente. Segundo Nakamura, o problema é que o contrato está na Secretaria de Licitações:

- Nunca vi esse contrato. Já procurei no controle interno esses contratos... Por mim, entrego para você... Mas, aqui em Aparecida, não funciona tudo bacana, tudo redondo - disse.

O GLOBO obteve os contratos de gestão no site do Idtech. No documento, a empresa deve prestar três serviços essenciais: marcar consultas, fazer atendimento ambulatorial e regular os leitos hospitalares. Quem fiscaliza o Idtech é a própria entidade. Nakamura diz que "todos os instrumentos contratuais firmados são submetidos aos órgãos de controle interno e externo na forma da legislação vigente", informação negada pelo Conselho de Saúde.

O próprio coordenador do Idtech diz que não há motivos para mistério:

- É uma besteira (não apresentar ao conselho). Esse contrato é público - afirma José Cláudio Romero, coordenador-executivo do Idtech.

Mais misterioso é o contrato com a empresa Techcapital, orçado em R$4 milhões ao ano, para prestação de serviços de raio-x, mamografia e eletrocardiograma. O CMS nunca soube desse contrato, que aguarda análise do Tribunal de Contas do Município. Ao GLOBO, um funcionário da Secretaria de Saúde informou que, além do preço acima do valor de mercado, o serviço não é prestado integralmente:

- Esse contrato não foi assinado por mim. Mas, em nenhum dos contratos haverá dolo. Se houve irregularidade em contratação, sou (ente) culposo, não sou doloso - disse Nakamura. (Roberto Maltchik)