Título: Dengue avança em meio a falhas
Autor: Alves, Maria Elisa; Lisboa, Vinícius
Fonte: O Globo, 25/03/2011, Rio, p. 17

Diagnósticos errados e despreparo de atendentes complicam combate à doença

Em meio ao aumento do número de casos de dengue e à chegada do vírus 4, que pode provocar uma epidemia no próximo verão, já que todos os moradores do Rio estão vulneráveis, as vítimas do Aedes aegypti ainda encontram dificuldades, como diagnósticos errados e despreparo de atendentes do serviço de informações sobre a doença. Além disso, o combate aos focos do mosquito tem deixado a desejar. Na casa das duas irmãs que contraíram o vírus 4, no bairro de Cafubá, em Niterói, nenhum agente de combate a endemias foi visto nos últimos meses. Ontem, porém, quando as jovens infectadas já estavam até curadas, o cenário era outro: 15 agentes do Ministério da Saúde cedidos à prefeitura percorreram a área. Além de buscarem criadouros, eles pulverizavam inseticida nas casas da região.

Numa primeira vistoria, não acharam nada errado. Mas, numa segunda inspeção no mesmo dia, foram encontradas na casa das irmãs Bárbara Brito, de 21 anos, e Caroline Graça, de 22, larvas de mosquito dentro de bromélias.

Piscina abandonada causa preocupação

Em Niterói, onde os primeiros casos do vírus 4 foram detectados, o controle de criadouros é feito por agentes de saúde que têm que visitar entre 800 e 1.200 casas a cada dois meses, segundo José Mauro de Souza, que coordena o trabalho na Região Oceânica. No entanto, o dentista Luiz Carlos Graça, pai das jovens infectadas, sequer lembra a última vez em que um agente esteve em sua casa. Este ano, afirmou, não ocorreu visita alguma.

Vizinha das vítimas, Edilene Muti, de 43 anos, tem levado desde a última quinta-feira a filha, Cristiane, de 15, à emergência do Hospital Mário Monteiro, em Piratininga, onde ela já ficou no soro duas vezes. Em frente à casa da família, uma piscina abandonada acumula água parada.

- Eu fico preocupada com essa piscina, porque minha filha está com dengue e meu filho de 10 anos também já teve - disse Edilene.

Ontem, enquanto o fumacê passava nas ruas da região, Luiz Carlos contava que, além da ausência do poder público, quem contrai dengue enfrenta outro problema: o despreparo dos médicos. Segundo o dentista, Bárbara e Caroline, ao sentirem dor de cabeça no carnaval, foram ao Hospital Santa Marta. Lá, fizeram exame de sangue e tiveram o diagnóstico de dengue confirmado. Dois dias depois, como pioraram, as irmãs voltaram ao hospital. Para espanto de Luiz Carlos, receberam novo diagnóstico. Uma médica afirmou que Bárbara tinha uma virose e Caroline, infecção urinária. A assessoria do hospital informou não ter conseguido entrar em contato com a administração da unidade para comentar o caso.

Após as filhas receberem o novo diagnóstico, Luiz Carlos pediu ajuda a uma prima, médica de família. Ambos decidiram não seguir o tratamento proposto, que incluía um antibiótico para Caroline.

- Saí do hospital rindo porque sabia que a médica estava errada. Eu tinha outra pessoa para me dar as recomendações certas. Mas e quem não tem? Os médicos devem aprender a diagnosticar. Deve ser falta de conhecimento - criticou Luiz Carlos.

No dia seguinte, as irmãs foram a uma Clínica de Família de Niterói. Carolina ficou internada por três dias no Hospital das Clínicas de Niterói. Bárbara não precisou ser hospitalizada.

Quem não tem um médico amigo para tirar dúvidas e procura ajuda no serviço de atendimento da prefeitura do Rio (pelo 1746) encontra dificuldades, como revelou um teste feito ontem à tarde pelo GLOBO. O primeiro problema é que, no princípio, o telefone fica mudo, como se a ligação não tivesse sido completada. Só depois de mais de um minuto entra uma gravação, perguntando se o morador quer falar sobre poda de árvores, multas, IPTU, dengue e outras opções.

Atendente deu informação errada

Durante o teste, numa das ligações, um repórter disse ter olhado sites sobre a dengue e lido que um dos sintomas era algo que ele não conhecia - petéquias (manchas avermelhadas na pele). A atendente disse que ia pesquisar do que se tratava e informou, minutos depois, não ter achado no sistema a informação. Em outra ligação, a atendente informou que diarreia era um sintoma de dengue em crianças de até 12, 13 anos, e que adultos não apresentavam esse problema, o que não é verdade. Num terceiro atendimento, o atendente deus todas as informações sobre sintomas corretamente e insistiu para que o repórter procurasse um médico. Também foi adequado o atendimento para denúncia de possíveis focos de dengue.

Desde o início do ano, a capital já registrou 9.559 casos de dengue.