Título: Itália é excluída de decisões sobre a guerra
Autor: Eichenberg, Fernando
Fonte: O Globo, 29/03/2011, O Mundo, p. 24

LONDRES e PARIS. À medida que os bombardeios da coalizão avançam sobre cidades líbias - e os rebeldes conseguem impor alguns reveses ao ditador Muamar Kadafi - cresce o desafio das potências ocidentais, incapazes de definir uma estratégia política para o futuro do país norte-africano. Com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) assumindo o comando militar da operação, os Estados Unidos anunciaram ontem o recuo de algumas de suas fragatas mobilizadas no Mar Mediterrâneo. No front diplomático, no entanto, a falta de coordenação evidente levou a um atropelo: os líderes de França, Reino Unido, Alemanha e Estados Unidos promoveram ontem uma teleconferência para debater a crise - deixando de lado a Itália, ex-potência colonial que dominou a Líbia e dona de importantes bases militares de onde partem os voos da coalizão.

A teleconferência - um dia antes da reunião marcada para discutir a crise hoje, em Londres - surpreendeu a imprensa da Itália, cujos sites estampavam ontem em letras garrafais a exclusão do país. Numa entrevista à rede La7, no entanto, o ministro das Relações Exteriores italiano, Franco Frattini, desmentiu qualquer mal-estar diplomático entre os aliados: - Não se estava decidindo nada, e a Itália não sofre de síndrome de exclusão.

Quando os ministros do Exterior dos integrantes da coalizão se reunirem hoje, em Londres, estarão na pauta propostas que vão do exílio do ditador líbio - como vêm articulando os italianos - ao apoio político legítimo aos rebeldes do Conselho Nacional -íbio visando à transição política pós-Kadafi. O dilema não é simples: além de esbarrar na insistência do ditador em permanecer, muitos ainda questionam o grau de confiança que se pode dar aos opositores - diversos, desconhecidos, desorganizados e sem experiência político-democrática.

EUA: petróleo rebelde não será alvo de sanções Outra potência que ficou de fora das negociações sobre a Líbia foi a Rússia. Segundo a agência Interfax, o país ? que se absteve na votação do Conselho de Segurança da ONU - não foi convidado. O chanceler Sergei Lavrov não poupou críticas à ofensiva militar e denunciou o que considera uma "ingerência em assuntos internos da Líbia". Já a Turquia, também reticente quanto à operação, ofereceu-se para mediar um cessar-fogo a fim de "evitar um segundo Iraque ou Afeganistão", afirmou o premier Recep Tayyip Erdogan ao "Guardian".

Seguindo os passos da França, ontem o Qatar tornou-se o primeiro país árabe a reconhecer os rebeldes como únicos interlocutores da Líbia - um dia depois de o governo de Doha anunciar um acordo para comercializar cerca de 100 mil barris de petróleo das áreas controladas pelos rebeldes. Ontem, o Tesouro americano também disse que o petróleo do território rebelde não será alvo das sanções.

Ontem, após retomar Nawfaliyah, os rebeldes avançavam rumo à cidade natal de Kadafi, Sirta, em busca de uma conquista estratégica e simbólica. A ação foi facilitada pelo bombardeio de uma das unidades militares mais importantes do ditador. Segundo o almirante americano Bill Gortney, seis mísseis Tomahawk foram lançados ao longo de 178 ataques feitos ontem contra alvos militares de Kadafi. De acordo com a rede al-Jazeera, as tropas leais a Kadafi teriam recuado, entrincheirando-se a 30 quilômetros de Sirta.

A pressão aérea se somou à iniciativa do presidente francês, Nicolas Sarkozy, e do primeiro-ministro britânico, David Cameron, que, num comunicado conjunto, convocaram partidários do ditador líbio a desertarem "antes que seja tarde demais".