Título: Governo estuda novas medidas para conter o câmbio
Autor: Carneiro, Lucianne
Fonte: O Globo, 01/04/2011, Economia, p. 21
Objetivo é evitar que dólar fique abaixo de R$1,65 e que a inflação ultrapasse o teto da meta, de 6,5%
Martha Beck, Vivian Oswald e Lucianne Carneiro
BRASÍLIA e RIO. Diante da forte entrada de dólares no mercado brasileiro - que derrubou na quarta-feira a cotação para R$1,629, menor nível desde 22 de agosto de 2008 - o governo deve tirar da manga novas medidas para tentar segurar os estragos que o câmbio vem provocando na competitividade da indústria nacional. Antes conformada com o dólar no patamar de R$1,70, ajudando o governo na tarefa de controlar a inflação, a equipe econômica quer evitar que dois problemas saiam do controle: que a moeda americana fique abaixo de R$1,65 (prejudicando mais a indústria num momento que o crescimento já está sendo revisto para baixo) e que a inflação ultrapasse o teto da meta, de 6,5%. Ontem, a moeda chegou a cair 0,49%, a R$1,621, mas após quatro intervenções do Banco Central, fechou a R$1,631, subindo 0,12% apenas.
As elevações do IOF para compras no exterior e empréstimos fora do país, por exemplo, eram ações que estavam no radar do governo para saírem em caso de emergência. Mas, como o mercado tende a se adaptar a novas medidas, outras permanecem no cardápio. No caso do câmbio, estão no leque de opções novas altas de IOF e quarentena para o ingresso de capital estrangeiro. No da inflação, mais alta de compulsório e exigência adicional de capital por parte dos bancos em determinadas modalidades de crédito.
- Há vazamentos (brechas para fugir do aperto do governo)? Sim. Se as empresas puderem, vão reduzir o desconforto das medidas adotadas pelo governo, o que é normal - afirmou o diretor de Política Econômica do Banco Central (BC), Carlos Hamilton de Araújo, ao divulgar o 1º Relatório de Inflação do governo Dilma Rousseff.
Hamilton disse também que o governo manterá as medidas já em vigor (muitas delas adotadas no último trimestre de 2010) até julgar necessário:
- Enquanto o BC entender que compulsório deve ficar estacionado aqui, continuarão. Com as outras medidas é o mesmo. Enquanto avaliar que devem continuar em vigor, ficarão.
Para conter a inflação, que deverá atingir um pico de alta no terceiro trimestre, chegando a 6,6% - acima da meta do governo -, a equipe econômica não descarta novas altas na Taxa Selic - na média, o mercado espera mais uma elevação de 0,5 ponto percentual, no fim deste mês. Isso, segundo relatório do BC, dependerá do comportamento dos indicadores após medidas macroprudenciais já adotadas e do cenário externo.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, disse ontem, em café da manhã com parlamentares da Comissão de Tributação e Finanças da Câmara, que o órgão está focado na inflação e no câmbio. No encontro, segundo relatos, ele defendeu as medidas tomadas pelo governo e disse que as ações surtirão efeito no segundo semestre, com desaceleração da inflação.
- Ele não sinalizou claramente que tomará novas medidas para evitar a queda do dólar, até porque isso pode influenciar o mercado. Mas essa é uma questão óbvia. Na minha opinião, há necessidade de se estabelecer um mecanismo de controle de capitais - disse o presidente da comissão, deputado Cláudio Puty (PT-PA).
Nos últimos dois anos, o câmbio foi um grande aliado no controle da inflação, segundo dados do BC. Em 2010, o IPCA, que ficou em 5,91%, poderia ter batido os 6,13% não fosse a ajuda do real valorizado - deixando importados mais baratos e derrubando os preços domésticos. Isso significa que o dólar contribuiu para reduzir o índice em 0,22 ponto. Em 2009, a ajuda foi de 0,24 ponto. Em 2007, 1,12 ponto.
- Mas agora a situação (do câmbio) chegou ao seu limite - disse um técnico do governo.
Estima-se que, ao oscilar abaixo de R$1,65, a moeda passe a ter mais efeitos negativos. O câmbio é uma reclamação recorrente do setor produtivo, sobretudo dos exportadores, que se queixam da perda de competitividade em relação aos produtos estrangeiros, que ficaram mais baratos. Por sinal, são as importações cada vez maiores que têm ajudado a economia a suprir a demanda do mercado nacional sem pressionar ainda mais os preços.
Importações devem continuar crescendo este ano
Pelas contas do BC, as importações devem crescer este ano 23,9% em relação a 2010, contra 18,9% das exportações. De acordo com o BC, as importações cresceram 42% no ano passado. Desse total, 37,5% corresponderam às quantidades trazidas para o país. E apenas 4,3%, preços.
O dólar acumula desvalorização de 1,92% em março e de 2,10% no ano. O BC entrou no mercado e conseguiu evitar a continuidade da valorização do real, com um leilão de swap cambial reverso (que equivale a uma compra no mercado futuro) - após tentativa inicial em que as propostas não foram aceitas - e três leilões de compra da moeda americana no mercado à vista. O montante estimado de compra no mercado à vista foi de US$1,12 bilhão. No último dia do mês, instituições financeiras pressionaram para reduzir as cotações do dólar. Assim, pagam menos na liquidação dos contratos.
COLABOROU Geralda Doca