Título: Alta do IOF sobre captações externas abre leva de medidas contra inflação
Autor: Barbosa, Flávia; Beck, Martha
Fonte: O Globo, 30/03/2011, Economia, p. 28

Aumento da alíquota visa a reduzir volume disponível para empréstimos

BRASÍLIA. A elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas captações no exterior inaugura uma nova leva de medidas macroprudenciais, que o Banco Central (BC) vinha indicando desde fevereiro. Além de buscar reduzir a exposição das companhias ao câmbio, a ação visa a diminuir o volume de recursos para empréstimos disponível no caixa de empresas e bancos, para frear a expansão dos financiamentos, que alimentam a inflação.

- Parte desse recurso entra aumentando o crédito no Brasil, e este é um momento em que nós estamos restringindo o crédito por causa do nível de atividade e da inflação. Isso (captação) colide com a restrição que o governo está fazendo - afirmou ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega. - O governo continuará tomando medidas para que o crédito se adeque às nossas necessidades de hoje.

Este ano, até 28 de março, empresas e bancos captaram no exterior US$38,5 bilhões, 86,9% a mais que no mesmo período de 2010 (US$20,6 bilhões). Do volume deste ano, 50% têm vencimento em até 360 dias. Pelo decreto, o IOF sobre operações até 90 dias passou de 5,38% para 6%. De 91 a 360 dias, passou de zero a 6%. A partir de 361 dias, a alíquota é zero.

Segundo cálculos da equipe econômica, as captações começam a "se pagar" a partir do décimo mês. O ganho de quem capta, que era de 8,75% ao ano entre o 10º e o 12º mês, caiu para 2,05% com a subida do IOF.

A avaliação da equipe econômica é que o dinheiro captado no exterior está financiando não só a compra de produtos - caso das montadoras, que têm bancos próprios - mas a formação de estoques, o que amplia o manejo de preços pelos fabricantes. As empresas não financeiras levantaram US$13 bilhões lá fora este ano, alta de 22,6% frente ao mesmo período de 2010. Já a captação das instituições financeiras saltou 155% na mesma comparação, para US$25,5 bilhões.

- Não é possível aumentar ainda mais o custo das empresas. Já temos juros elevados. Temos é que desonerar a produção - reclamou o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade.

Mantega, porém, afirmou que as empresas que captam lá fora a médio e longo prazos não serão prejudicadas.

Para economista, governo precisa cortar gastos

A ação também deve atenuar as operações de carry-trade - pegar recursos em um país com juros baixos e aplicá-los em outro com taxas mais altas. O Brasil tem o maior juro real do mundo.

- Achamos que a medida vai segurar uma parte desse fluxo de capital de curto prazo. Em vez de lucrar 13%, 12%, 11%, as empresas vão lucrar 6% menos - afirmou o ministro. - Se começar a aumentar (o montante de captações) para prazos acima de 360 dias, também tomaremos medidas adequadas.

Mantega disse não haver qualquer mudança prevista para conter o ingresso de investimento estrangeiro direto, mas ressaltou que o governo vai "olhar tudo com lupa".

O IOF maior também reduz a exposição das empresas em moeda estrangeira. Com o rombo nas contas externas, torna-se cada vez mais provável que o dólar suba frente ao real.

- Essa medida, isoladamente, não deve ter impacto relevante no mercado de câmbio. O que importa é o fato de que o governo central retomou o uso das medidas macroprudenciais como principal estratégia para conter a liquidez no mercado cambial - disse o economista Darwin Dib, do Itaú Unibanco.

Para Flávio Serrano, economista sênior do BES Investimento, os recursos de fora são o menor problema no combate à inflação:

- O Brasil passa por um momento de economia aquecida, com uma população propensa a consumir. E está aquecido num momento em que o resto do mundo não está. Esse é um quadro conjuntural que só vai mudar mais à frente. Até lá, o que o governo tem de fazer é cortar gastos de fato para conter a inflação. Não adianta ficar fazendo medida atrás de medida. Isso só vai trazer ruído.

COLABOROU Vivian Oswald