Título: Acordo histórico entre Brasil e Paraguai
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 26/07/2009, Mundo, p. 23

Depois de muita negociação, país vizinho poderá vender o excedente de energia livremente no mercado brasileiro

Em guarani, Itaipu significa o ¿som da pedra¿. E o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, conseguiu tirar o som que queria de seu único sócio na hidrelétrica binacional, na fronteira com o Brasil. Ontem, ele se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio de López, sede do governo paraguaio, e debateu a oferta brasileira para as reivindicações paraguaias. Depois de muita insistência do vizinho, o governo liberou o Paraguai para comercializar livremente seu excedente de energia no mercado brasileiro por meio da Administração Nacional de Eletricidade (Ande).

O ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, entendeu que o tratado não obrigava o Paraguai a vender a energia para a Eletrobras, mas sim ao Brasil. O presidente Lula também concordou com o aumento das compensações que o governo paga ao país vizinho pelo excedente energético de US$ 120 milhões para US$ 360 milhões. ¿Os paraguaios receberão US$ 240 milhões a mais, o que é muito dinheiro, venderão gradualmente a energia e verão que não é tão fácil vendê-la no mercado¿, afirmou ao Correio o especialista brasileiro em Itaipu Wagner Enis Weber, que acompanhou as negociações em Assunção. Segundo Wagner, a Petrobras está marcando presença no mercado da energia elétrica no Brasil por meio da exploração do gás de suas usinas termelétricas. ¿No ano que vem, a Petrobras terá uma estrutura que será quase uma Itaipu montada em termelétrica, com 10 milhões de kilowatts de potência¿, disse.

Lugo reiterou o desejo de dispor da energia de Itaipu para oferecê-la a outros países, observando, porém, a preferência do Brasil. O tratado proíbe aos sócios incluir terceiros na recepção de energia. Lula conseguiu jogar a possibilidade para frente, quando termina a dívida do Paraguai com o Tesouro brasileiro, correspondente aos investimentos para construção da usina binacional. O presidente destacou que os dois países ¿devem trabalhar juntos na busca de uma integração energética regional que contemple a possibilidade de que Paraguai e Brasil possam comercializar a energia de Itaipu com terceiros mercados a partir de 2023¿.

Compensações Com a oferta brasileira, o Paraguai passará a receber quase US$ 1 bilhão pela aquisição da energia não consumida. Serão US$ 610 milhões em royalties e compensações, que vão diretamente ao governo paraguaio, US$ 300 milhões em gastos de exploração (investimentos, remunerações, manutenção, gastos sociais) pagos à margem paraguaia de Itaipu, e US$ 40 milhões à Ande e à própria Itaipu, como remuneração sobre o capital e compensação por gastos administrativos.

Nos próximos 60 dias, as delegações discutirão propostas específicas para colocar as decisões em prática sem mexer no Tratado de Itaipu. Segundo Weber, os US$ 240 milhões por ano a mais devem sair do Tesouro Nacional do Brasil, uma vez que o governo brasileiro acredita que não haverá problemas para o Congresso Nacional aprovar a medida.

O Brasil também ofereceu obras para elevar a capacidade de transmissão de energia de três subestações paraguaias sem custo para o país vizinho. Weber ressalta que a produção de riqueza está mais no uso da energia elétrica e não no valor que se recebe por ela. ¿Em média, um megawatt-hora usado na economia do país gera US$ 4 mil em PIB de um país da região.¿ Com a assinatura da declaração, o Brasil reforçou sua disposição de financiar obras no país vizinho. Entre os itens acertados, está a construção de duas pontes entre Brasil e Paraguai, uma conexão ferroviária e a cooperação para eletrificação de todo o Paraguai.

Lula anunciou que voltava para casa satisfeito e pediu que as próximas reuniões bilaterais não sejam só para ver defeitos no Tratado de Itaipu. Lugo destacou que se marcava uma nova etapa. ¿Não é quem ganha ou quem perde. Ganhamos todos¿, disse. Agora é esperar que a pedra silencie.

O número US$ 360 milhões É o novo valor que o Brasil vai pagar ao Paraguai pelo excedente energético de Itaipu

Empregos na indústria

Os 70 mil habitantes de Villa Hayes, cidade às margens do Rio Paraguai e a 31km da capital, Assunção, é que poderão sair beneficiados com a última visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao país. A economia baseada em agropecuária e turismo vai receber a instalação de uma fábrica de cimento pela construtora Camargo Corrêa. A empresa brasileira anunciou ontem, no marco da visita oficial, que investirá US$ 100 milhões para o projeto. A construtora prevê que a fábrica começa a operar dentro de dois anos e deve empregar diretamente cerca de 280 operários e, de forma indireta, outras centenas de trabalhadores. A declaração foi feita após uma reunião entre empresários brasileiros e paraguaios junto a Lula e ao presidente do Paraguai, Fernando Lugo, na residência presidencial de Mburuvichá Róga. Os dois presidentes também aprovaram um tributo único de 25% para a Ciudad del Este, na fronteira entre Paraguai e Brasil. ¿Essa é uma conquista enorme para as pessoas de Ciudad del Este, porque com isso elas podem intensificar a venda de seus produtos¿, disse o vice-ministro de Comunicação, Roque González.

Lugo declarou ainda que vai procurar uma terceira entidade para financiar uma linha de transmissão de energia elétrica de Itaipu a Villa Hayes. Entre as instituições já confirmadas, estariam o Banco Mundial (US$ 10 milhões) e o Banco Europeu de Investimentos (US$ 194,3 milhões). Cogita-se que o terceiro poderia ser o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), com um aporte de

US$ 84,3 milhões. ¿Sempre criticamos o paradoxo de ser um país exportador de energia que vive na incerteza dos apagões¿, disse Lugo. A construção deve começar em julho de 2010 e durar de 24 a 26 meses.