Título: Lula abre empresa para cuidar de palestras
Autor: Farah , Tatiana
Fonte: O Globo, 03/04/2011, O País, p. 14

SÃO PAULO. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva virou empresário. Aos 65 anos, o ex-metalúrgico abriu sua primeira empresa para oficializar sua mais recente profissão, a de palestrante. A LILS Palestras, Eventos e Publicações Ltda foi constituída na Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp) no dia 18 de março, em sociedade com seu amigo e assessor Paulo Okamotto. O ex-presidente deve criar ainda o Instituto Lula, para que possa receber verbas de empresas e assim desenvolver seus projetos.

O capital declarado na abertura da LILS, de R$100 mil, é menor que o preço médio de cada palestra, entre R$150 mil e R$200 mil. O endereço é o apartamento do ex-presidente, em São Bernardo do Campo. Uma dessas palestras foi realizada no mês passado para uma indústria de eletrônicos, a LG, ao custo de R$150 mil. Esta semana, o ex-presidente embarca para os Estados Unidos para outra atividade remunerada, desta vez em um encontro organizado pela Microsoft, em Washington.

Okamotto à frente de dois projetos do amigo Lula

Amigo de Lula há mais de 30 anos, Okamotto acompanha o ex-presidente desde os tempos em que ele presidia o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo. No governo lulista, foi presidente do Sebrae nacional. Em 2006, quando o então presidente era acusado de não explicar a quitação de uma dívida de R$29 mil com o PT, Okamotto afirmou que havia dado o dinheiro para que Lula encerrasse o empréstimo feito junto ao PT e que ele não havia pago.

Agora, no "pós-Lula", Okamotto retomou as rédeas do Instituto Cidadania e é o articulador de uma Oscip (organização da sociedade civil de interesse público), que abrigará os projetos de Lula, além de ser o sócio da nova empresa.

- Agora o presidente é empresário. Vocês reclamavam que ele não tinha estudado, e agora ele tem alguns títulos de doutor honoris causa. Reclamavam que ele não trabalhava, agora ele é empresário - brincou Okamotto, que tem apenas 2% da LILS, sendo outros 98% de Lula.

Segundo o sócio de Lula, a empresa foi aberta para "separar a atividade política das atividades remuneradas":

- A ideia é que Lula faça apenas algumas palestras remuneradas. Mas o foco é a política, o Brasil, a África. E, disso, quem vai cuidar é o Instituto Lula - diz Okamotto.

Enquanto o Instituto Lula não sai da gaveta, o ex-presidente usa as instalações e os documentos de uma antiga entidade petista, o Instituto Cidadania, que tem sede própria na região do Ipiranga, Zona Sul de São Paulo, e que tem em Lula o principal dirigente.

- Estamos usando provisoriamente o Instituto Cidadania, que é uma ONG (organização não governamental). Já o Instituto Lula será uma Oscip. Terá uma outra sede e vai buscar recursos das empresas - adianta Okamotto ao GLOBO.

Sede provisória recebe reformas e cerca elétrica

Sócio do ex-presidente na firma de palestras e dirigente do Instituto Cidadania, Okamotto confirma que o Instituto Lula deverá buscar recursos das empresas com o intuito de desenvolver projetos tanto para o Brasil quanto internacionais, principalmente voltados para os problemas da África.

Um dos projetos deverá ser a discussão de programas energéticos para os países africanos. Desde janeiro, quando deixou o governo, Lula já foi à África três vezes: para o Fórum Social em Dacar, no Senegal; para a Guiné; e para o Qatar, onde participou de um seminário promovido pela rede árabe Al-Jazeera.

- O Instituto Cidadania evitava usar recursos das empresas privadas porque Lula era presidente. Agora, ele não é presidente nem candidato. Vamos receber verbas das empresas, e não há no Brasil empresa que não tenha ligações com os governos - avisa ele, que completa, em tom de brincadeira: - Vocês já podem ir reservando páginas e páginas de críticas, mas precisamos tocar projetos que discutam, por exemplo, as fontes de energia para a África.

O primeiro "recurso" recebido pelo ex-presidente Lula para o patrimônio do Instituto Cidadania foi um carro blindado, doado por um empresário libanês durante jantar em homenagem ao ex-presidente, promovido há duas semanas pela comunidade muçulmana em São Paulo, no Clube Monte Líbano. Embora não tenha intenção de permanecer no Cidadania, a sede da entidade, que estava às moscas, foi turbinada por uma reforma que renovou toda a sua fachada e aumentou a segurança com muros reforçados e uma cerca elétrica.