Título: Acordo negociado é a saída
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 26/07/2009, Mundo, p. 24
O analista político Jorge Yllescas Oliva, ex-diretor executivo da Receita Federal de Honduras, não acredita em guerra civil ou insurreição popular em seu país. No entanto, o especialista de 65 anos admite que a crise atual abre brecha para mais mortes, graças ao ambiente polarizado e fanatizado, e ameaça a América Central, principalmente no campo econômico. Em entrevista ao Correio, por e-mail, de Tegucigalpa, Oliva defendeu uma saída negociada, com base na proposta do presidente costa-riquenho, Oscar Arias ¿ a formação de um governo de unidade e reconciliação nacional. Para o estudioso hondurenho, ex-presidente do Centro de Investigação e Estudos Nacionais (CIEN) e ex-ministro de Recursos Naturais e Meio Ambiente, Zelaya já havia legalmente perdido o cargo de presidente ao ser capturado pelos militares, após desafiar as leis e as instituições do Estado.
O presidente da Costa Rica, Oscar Arias, propôs um governo de unidade. Como vê essa proposta? A proposta de Oscar Arias é boa, na medida em que ele coloca a possibilidade da integração de um governo de unidade nacional com representação de todos os cinco partidos políticos e grupos da sociedade civil organizada. Mas o governo não aceita a presença de Manuel Zelaya por causa de delitos de violação à Constituição e corrupção. Essa opinião é compartilhada pelos dois partidos que registram 95% dos votos e dois menores que recebem 2% do eleitorado nacional. A exceção fica por conta do partido de esquerda, que apoia Mel (responsável por menos de 1% do eleitorado). Esse critério de oposição a Zelaya é compartilhado por todas as igrejas, que somam 97% da população; as empresas privadas; as micros, pequenas e médias empresas; e organizações da sociedade civil. Os grupos que apoiam Zelaya são os sindicatos e setores do magistério.
Qual é a saída para a crise? A saída inteligente deve ser um acordo negociado, com base na proposta de Arias. Isso é possível, pois o presidente de fato, Roberto Micheletti, tem manifestado que seu cargo está à disposição para arranjos que não sejam o retorno de Zelaya.
Por que a convocação da Constituinte é tão rejeitada? A Constituição pode ser modificada em 98% de seu teor, inclusive com mudanças dos artigos. Mas não há a possibilidade de Constituinte, como queria Zelaya. Ele desejava modificar artigos inalteráveis, especialmente o que se refere à não reeleição. O senhor Zelaya armou um plebiscito, mesmo quando seus assessores o advertiram que isso cabia apenas ao Supremo Tribunal Eleitoral. Ele insistiu e mudou o título do plebiscito para ¿pesquisa de opinião pública¿. Despachou todos os ministros e uma parte considerável dos funcionários públicos a todo o país, pedindo à população que aprovasse a Constituinte. Isso custou mais de US$ 30 milhões aos cofres públicos. O Supremo Tribunal Eleitoral divulgou um comunicado, lembrando ao senhor Zelaya que uma Quarta Urna (referendo) não estava contemplada pela legislação nacional. A Procuradoria-Geral da República, o Ministério Público e a Corte Suprema de Justiça proibiram o ex-presidente de realizar esse evento. Zelaya insistiu no propósito. A Corte Suprema emitiu três ordens de captura contra ele. Depois de Zelaya convocar uma ¿pesquisa de opinião pública¿ no Diário Oficial, a Corte Suprema invocou o artigo 239 da Constituição, que diz: ¿O cidadão que tiver desempenhado a titularidade do Poder Executivo não poderá ser presidente ou vice-presidente da República¿. Ao ser capturado, o senhor Zelaya já não era presidente. A expulsão de nosso país se fez com base no artigo 24 do Código Penal, que contempla os casos de ¿estado de necessidade¿. Isso para evitar um banho de sangue. Zelaya assaltou a Força Aérea com seguidores para tomar urnas feitas na Venezuela.
Como vê a interferência de Hugo Chávez em Honduras? As reiteradas intervenções e irresponsáveis opiniões e ameaças do presidente venezuelano, Hugo Chávez, têm provocado indignação em meu povo. Acredita-se que o propósito de Zelaya era fazer uma nova Constituição, por meio da Constituinte, como um decalque da Constituição da Venezuela. Desejava estabelecer uma ditadura constitucional.
Como fica o futuro de Honduras? Zelaya não entrará no país, mas tentará provocar a polícia e o Exército para que reprimam seus simpatizantes. O que ele busca são mártires. Isso não se torna difícil em um ambiente polarizado e com fanáticos a seu lado.
A crise representa perigo para a estabilidade centro-americana? A crise afeta a economia dos vizinhos. Honduras está no centro e é banhada pelo Atlântico e Pacífico. El Salvador e Nicarágua fazem a importação e exportação pelo Atlântico hondurenho.
Ao ser capturado, o senhor Zelaya já não era presidente