Título: De doméstica a ministra do Tribunal do Trabalho
Autor: Castro , Juliana
Fonte: O Globo, 03/04/2011, O País, p. 17

Quando a leve faixa vermelha e branca destinada ao grupo de 27 ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) cingiu seu ombro direito, Delaíde Alves Miranda Arantes não podia mais fugir do peso da responsabilidade. O sorriso fácil e o vasto currículo - que inclui 30 anos como advogada trabalhista, duas pós-graduações e três livros publicados - são incapazes de transparecer as dificuldades que ela driblou para ser empossada ministra no último dia 24. Aos 58 anos, Delaíde é uma ex-empregada doméstica.

Até a adolescência, ela viveu na roça, como se refere a Pontalina, cidade de 17 mil habitantes a 120 km de Goiânia (GO). Foi lá que, aos 16 anos, Delaíde trabalhou pela primeira vez numa casa de família, para custear os estudos, já que os pais não tinham condições de arcar com a educação de nove filhos.

- Como fui criada na roça, era habituada a fazer trabalho de casa - conta a ministra, hoje casada e mãe de duas filhas.

De segunda a sábado, das 7h às 16h, Delaíde podia ser encontrada num endereço certo: a casa de Sueli Reis, hoje com 65 anos. Entre um "ela era muito dedicada" para lá e um "ela era caprichosa" para cá, a ex-patroa diz que a amizade entre as duas já dura mais de 40 anos.

- Minha tia disse que eu precisava de alguém para me ajudar e falou que tinha uma mocinha bem bacana para indicar - recorda a ex-patroa, que viajou com o marido de Minas Gerais a Brasília para ver a posse de sua ex-doméstica no TST.

Por quase dois anos, a rotina de Delaíde foi limpar, passar, cuidar do filho da patroa e se dedicar a outras tantas atividades comuns a domésticas do Brasil afora. Ao mesmo tempo, separava horas para ler, escrever e sonhar com um futuro promissor.

- Trabalhava no sentido de não ficar a vida toda naquilo, mas fazia o serviço com todo o gosto - diz a ministra, que ainda conserva jeito simples e fala mansa dos tempos de roça.