Título: Sem trégua a Sarney
Autor: Rothenburg, Denise; Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 30/07/2009, Política, p. 5

Após reportagem do Correio, aumenta a lista de denúncias contra o presidente do Senado. PMDB promete reagir com representações a outras legendas, ameaçando alianças para eleições de 2010

Sarney é o pivô de uma crise que ameaça implodir as alianças entre PMDB e tucanos para o pleito de 2010

Enquanto o governo se preocupa mais com os reflexos da atual crise do Senado, os parlamentares têm os olhos voltados para o Conselho de Ética, onde a chuva de representações e denúncias (1)contra o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), parece não ter fim. Com base em notícia divulgada ontem pelo Correio sobre o vazamento de informações privilegiadas de um agente da Polícia Federal ao grupo liderado por Fernando Sarney ¿ filho do peemedebista ¿, os senadores Cristovam Buarque (PDT-DF) e Arthur Virgílio (PSDB-AM) apresentaram nova denúncia ao conselho contra o colega. Matéria publicada na Folha de S. Paulo sobre propriedades de Sarney em nome de terceiros motivou outra ação. Agora, já são cinco as representações contra Sarney. No entanto, a lista deve aumentar, respingando em outros congressistas. O PMDB representará em desfavor de Virgílio e, se o DEM vier a engrossar a fila de denúncias contra Sarney, seus senadores também se tornarão alvos do conselho.

Tomadas como uma declaração de guerra pelo PMDB, as representações que o PSDB apresentou ao Conselho de Ética para atingir José Sarney estão a um passo de implodir as negociações entre tucanos e peemedebistas para as eleições de 2010. Os dois partidos discutem alianças em vários estados, como São Paulo, Alagoas, Paraná e Minas Gerais. ¿Enquanto as denúncias eram uma atitude isolada (de Virgílio), uma insanidade, o partido tolerava. Agora, no momento em que viram uma ação partidária, o PMDB tem que reagir. Estamos aliados em vários estados, mas não dá mais. Infelizmente, é a marcha da insensatez¿, disse ao Correio o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), num tom de ameaça em relação às alianças regionais.

No quesito representações ao Conselho de Ética, o líder peemedebista avisa que a decisão está tomada. ¿As representações seguem para o conselho na sexta ou, no mais tardar, na segunda-feira¿, afirmou Renan, referindo-se ao fato de Virgílio ter nomeado pessoas de uma mesma família para o seu gabinete e, ainda, ter confessado em plenário que pagou hora extra a um funcionário que morava em Barcelona, na Espanha. ¿Virou uma guerra partidária de quem terá mais representações¿, completou Renan.

No Poder Executivo, as avaliações sobre a crise do Senado indicam que o retorno das férias dos senadores será tenso e longe do clima de festividade que costuma marcar a volta às aulas. A maior preocupação é com a perspectiva de paralisação dos trabalhos e derrota do governo. No fim do semestre passado, o governo viu sucumbir vários indicados para o Conselho Nacional do Ministério Público.

O mau humor dos senadores não é apenas reflexo da crise interna do Senado. Ontem, por exemplo, o senador César Borges (PR-BA), de férias na Rússia, foi informado por telefone que um cargo que ele pretendia indicar na Companhia Docas da Bahia (Codeba) acaba de ser destinado a José Muniz Rebouças, escolhido pelo governador da Bahia, Jaques Wagner, do PT.

Por falar em PT, o líder da bancada no Senado, Aloizio Mercadante, que voltou a defender o afastamento de Sarney na última sexta-feira, levou ontem um puxão de orelhas virtual do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu: ¿O presidente nacional do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), deixou claro a postura do partido: o pedido é do líder, não da bancada petista. O PT também não assinará representação contra o presidente da Câmara Alta¿, afirmou o ex-ministro em seu blog, não escondendo as preocupações com as consequências da crise.

Turbulência

A turbulência no Senado, aliás, cresce a cada dia, mesmo durante o período de recesso parlamentar. Um dos ingredientes que engrossou o caldo foi a reportagem publicada ontem no Correio, revelando que um policial federal cedido pela Presidência da República ao senador Sarney na cota de funcionários de ex-presidentes da República, Aluizio Guimarães Filho, utilizou seus contatos na polícia para informar Fernando Sarney sobre uma diligência solicitada à Superintendência de São Paulo, em julho do ano passado. Policiais federais estavam monitorando Marco Antônio Bogea, que havia viajado para a capital paulista portando uma mala.

Com a suposta ajuda de amigos policias federais, Aluizio confirmou que o veículo utilizado na campana era da corporação. ¿O carro é nosso mesmo¿, informou o agente a Fernando, por telefone. Em seguida, esclareceu que a investigação era uma solicitação da Diretoria de Investigação de Crimes Financeiros. ¿A investigação em cima de mim é conduzida por esse pessoal¿, lamentou Fernando. Aluizio informou até o número do inquérito policial. Hoje, ele trabalha para a governadora Roseana Sarney no Serviço de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Maranhão.

1 - DIFERENCIAÇÃO Há diferenças entre denúncias e representações feitas contra senadores. As denúncias podem ser de qualquer parlamentar. No entanto, esse recurso precisa ser apreciado em primeiro lugar pela Mesa Diretora. Se aceito, segue para o Conselho de Ética. Já as representações têm mais peso. Só podem ser apresentadas pelos partidos políticos e não necessitam de apreciação prévia da Mesa. O presidente do conselho pode acolher os pedidos ou rejeitá-los. Nessa segunda hipótese, cabe recurso ao plenário.