Título: Perdas e danos
Autor: Carvalho, José Otavio
Fonte: O Globo, 11/04/2011, Opinião, p. 7

Aindústria do cimento brasileira é hoje reconhecida internacionalmente por sua excelente performance energética e ambiental e pela reduzida emissão de gases de efeito estufa, inclusive quando comparada a países desenvolvidos, como Estados Unidos, da União Europeia e Japão. Essa posição privilegiada não ocorre por acaso, mas é fruto de um enorme esforço das indústrias que realizam, há muitos anos, ações que resultaram em significativa redução de suas emissões, contribuindo no combate às mudanças climáticas.

De acordo com o 2º Inventário Brasileiro de Emissões de Gases de Efeito Estufa, recentemente divulgado pelo Governo, a participação do cimento é de apenas 1,4% da emissão total de CO2 do Brasil. Em um país onde as queimadas florestais são as principais fontes de emissão, esse valor está muito abaixo da média mundial do setor de cimento.

A Agência Internacional de Energia, em estudo recentemente publicado, analisou o potencial de redução das emissões de CO2 da indústria cimenteira dos principais países produtores do mundo, com base nas melhores práticas existentes. O resultado apresentou a indústria brasileira como a de menor potencial, em virtude do grau de excelência alcançado quando comparado aos outros países, que ainda não conseguiram implementar plenamente essas ações.

Essa posição de destaque ocorre graças a um parque industrial moderno e eficiente, resultado do esforço do setor na busca por um melhor aproveitamento energético desde a crise do petróleo na década de 70. Praticamente todo o cimento no país é hoje produzido por via seca, em fornos equipados com pré-aquecedores/pré-calcinadores, garantindo uma grande redução no uso de combustíveis e, consequentemente, menor emissão de CO2.

O Brasil também é referência na produção de cimentos com adições. Praticado no país há mais de 50 anos, o uso intensivo de resíduos como cinzas de termelétricas e escórias siderúrgicas na produção de cimento está sendo seguido hoje no mundo pelo fato de reduzir a emissão e conferir propriedades específicas de aplicação, valorizando o produto.

O setor, ainda, utiliza cada vez mais combustíveis alternativos (pneus, óleos, tintas, bagaço de cana, carvão vegetal, casca de arroz etc.), em substituição a combustíveis fósseis não renováveis.

Essa situação privilegiada do Brasil não se replica no mundo inteiro. Diversos países ainda utilizam equipamentos e processos pouco eficientes, levando a um aumento do uso de energia e das emissões. Alguns desses, que respondem por grande parte da produção mundial de cimento, como China, Índia e Rússia, ainda têm parte de seus parques industriais com fornos de tecnologias obsoletas.

Alguns, no entanto, realizam hoje grandes projetos de transformação de suas indústrias. O governo chinês vem trabalhando em um ambicioso programa de substituição de milhares de pequenos fornos verticais, de baixa capacidade de produção e altíssimos níveis de consumo energético e emissão de gases e poeira, por modernas unidades equipadas com sistemas de controle de poluição, filtros de alto desempenho e monitoramento on-line dos gases, como as existentes no Brasil. Uma ótima notícia, já que a China produz metade do cimento no mundo.

Esse esforço mundial na direção de uma produção cada vez mais limpa vai continuar. No Brasil, evoluímos muito, e precisamos seguir avançando. Nosso desafio é grande, já que o crescimento econômico e da construção civil está exigindo incrementos na produção de cimento. Deve-se trabalhar para que a expansão do parque se dê sempre por meio da implantação de unidades modernas, como as já existentes, de alta eficiência energética e menor emissão, dentro dos mesmos padrões de excelência responsáveis por nos propiciar o atual reconhecimento internacional. Sem cair na tentação, no ímpeto de atender pequenos mercados em crescimento, de admitir a adoção de processos e tecnologias ineficientes que hoje estão sendo abandonadas no mundo, comprometendo nosso sucesso e prejudicando o meio ambiente e a comunidade.

JOSÉ OTAVIO CARVALHO é presidente do Sindicato Nacional da Indústria do Cimento. YUSHIRO KIHARA é gerente de Tecnologia da Associação Brasileira de Cimento Portland.