Título: Eu vou juntar esses cacos em que eu me fiz
Autor: Dutra, Fernanda
Fonte: O Globo, 11/04/2011, Rio, p. 15

Professora narra o encontro com o assassino; ela quer voltar a dar aulas na escola, mas ainda não se considera pronta

PROFESSORA LEILA conta ao ¿Fantástico¿ os momentos de pânico que passou na escola de Realengo

A professora de português Leila D'Angelo, que estava na sala onde começou a chacina, contou ao ¿Fantástico¿, da TV Globo, que até hoje não entende por que Wellington Menezes de Oliveira não a matou:

¿ O que mais chamou minha atenção foi exatamente a disposição dele em matar as crianças. É horrível, mas seria óbvio: primeiro ele me mataria, até para eu não correr.

A professora Leila disse que fez cara feia quando Wellington entrou na classe, porque ele não tinha batido na porta. O assassino já carregava uma bolsa de viagem:

¿ Eu olhei nos olhos dele, ele tava normal, tranquilo, não estava tremendo, nem nada. Ele foi entrando e, daqui a pouco, falou assim: ¿eu vim dar uma palestra¿. Aí eu virei para ele e falei: ¿como?¿ Quando eu falei isso, ele já abriu (a bolsa). Estava de costas, as crianças olhando, esperando para ver quem era. Todo mundo normal. Ele abriu a bolsa e com as duas mãos, ao mesmo tempo, pegou dois revólveres. Enquanto pegava os revólveres, ele falava assim: ¿vim dar um palestra e já atirou¿ ¿ contou Leila.

Professora gritou para os alunos fugirem

A professora só se deu conta do que acontecia após o terceiro tiro disparado por Wellington. Naquele momento, disse Leila, o atirador matava a esmo, sem escolher as vítimas. Os alunos e a professora assistiram em desespero Wellington recarregar duas vezes as armas. Enquanto isso, Leila gritava para os alunos fugirem e ajudava a quem podia, já saindo da sala.

¿ Se eu ficasse ali, não iria ajudar em nada. Eu acabaria, talvez, levando um tiro ou vendo ele matar. Não poderia desarmá-lo, não poderia fazer nada. Então, só pensava : ¿tenho que salvar estas crianças¿. As que estavam perto de mim, eu puxava e descia. Era só isso que eu conseguia pensar.

Há 25 anos dando aulas, 16 deles na Escola Tasso da Silveira, Leila acredita que Wellington não teria conseguido entrar no prédio se não tivesse se identificado como ex-auno:

¿ Ele tinha ido (à escola) uma semana antes pegar o histórico. Naquele dia (da tragédia), foi na secretaria pegar o histórico e a grade estava fechada. Ele pediu para subir para falar com a professora. Todo mundo sabia que não tinha palestra aquele dia. A grade foi aberta porque ele era ex-aluno. Só por isso que ele conseguiu.

Em estado de choque, Leila diz que não está pronta para voltar à escola:

¿ Eu fico imaginando: como é que eu vou entrar naquela sala e olhar para aquelas crianças? Sei que eu preciso deles e eles precisam de mim. Afinal de contas, sou professora. Mas hoje não sou inteira, eu sou cacos. Eu vou juntar esses cacos em que eu me fiz e eu vou dar força para os meus alunos.