Título: Nova onda de reajuste na indústria
Autor: Ribeiro, Fabiana; Novo, Aguinaldo
Fonte: O Globo, 10/04/2011, Economia, p. 27

Depois das "commodities", pressão agora vem de insumos industriais. Fenômeno é global

BRASÍLIA. Se a "gigantesca" pressão das commodities mencionada pelo Banco Central (BC) no Relatório de Inflação ainda não se dissipou por completo e continua sendo fonte de preocupação para a autoridade monetária, uma nova onda de aumentos ronda a economia mundial e assusta os países em desenvolvimento, em especial o Brasil: a dos produtos industrializados (insumos para o setor produtivo nacional). Depois de absorver boa parte do impacto da disparada dos produtos básicos, a indústria dá sinais de que deve começar a repassar seus custos.

- Já começou. Trata-se de um problema mundial - admitiu o economista-chefe da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flavio Castelo Branco.

- Muitas empresas têm absorvido custos, mas começaram a aumentar seus preços. Depois das commodities, os manufaturados vão começar a aumentar pelo mundo todo - disse o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.

O aço deve ser um dos primeiros da lista, com um aumento estimado em 10% pelo setor. Em seguida, vêm os derivados do aço, derivados de petróleo (plásticos, parafina e nafta, por exemplo) e fertilizantes. De janeiro a fevereiro deste ano, as importações de fertilizantes somaram US$846 milhões. Trata-se de um volume 34% maior do que no mesmo período do ano passado. Mas, em termos de preços, são 868,8% a mais.

A indústria química também começou o ano com aumentos e diz que tem absorvido o recente custo da explosão dos preços das commodities. Segundo a diretora de Economia e Estatísticas da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Fátima Giovanna, a indústria vinha evitando os repasses, pois as principais economias do planeta ainda se recuperavam da crise.

No caso do Brasil, as empresas nacionais seguraram os preços em função da concorrência com produtos importados, que foram rapidamente direcionados ao mercado brasileiro, menos atingido pela crise. Mesmo assim, segundo ela, como se trata de um fenômeno mundial, as próprias importações devem trazer os aumentos para dentro do país. O Brasil hoje importa 30% dos derivados químicos que consome.

As incertezas sobre o que acontecerá com os preços do petróleo criam um cenário ainda mais nebuloso. O mesmo ocorre sobre o futuro do Japão:

- Trata-se de um grande fornecedor de produtos transformados para o mundo - disse Giovanna.

Países que, como o Brasil, dependem das importações de bens manufaturados, devem ser as primeiras vítimas. Cerca de 50% do que importa em bens de capital (máquinas e equipamentos) são usados para investimentos na indústria nacional.

A alta dos preços das commodities tem sido a grande vilã da inflação desde o fim do ano passado, mas, como o Brasil é o segundo maior produtor agrícola do mundo, também vem ajudando a fechar as contas externas. Assim, o problema é maior quando a elevação dos preços se concentra em outros produtos que o país é obrigado a importar.

Os preços agrícolas registraram variação acumulada em 12 meses de 29,84% em fevereiro, ante 23,86% em novembro, enquanto os preços industriais aumentaram, respectivamente, 8,65% e 9,90% nas mesmas bases de comparação.

Segundo o Relatório de Inflação do BC, o chamado índice de difusão - indicador da proporção de itens que apresentou variação positiva no IPCA, evidenciando disseminação dos aumentos - registrou média de 64,41% no trimestre encerrado em fevereiro, contra 64,84% naquele finalizado em novembro e 63,54% em igual período de 2010.

Em 2010, a média do índice atingiu 61,18%. Em 2009, foram 57,53%. O documento do BC alerta para o fato de "nos mercados emergentes, de certa forma, as pressões inflacionárias têm se generalizado".

Segundo o professor da PUC-SP, Antonio Corrêa de Lacerda, praticamente todos os países que adotam o regime de metas de inflação vão ultrapassar seu teto em 2011:

- A inflação é um fenômeno mundial - disse ele.

Segundo dados da revista "The Economist" compilados pelo Ministério da Fazenda, em janeiro deste ano, a inflação anualizada da Rússia já estava em 9,6%, enquanto a da Índia, era de 9,7%, contra 6% do Brasil e 4,6% da China.