Título: Porta aberta para alta da gasolina
Autor: Beck, Martha; Gomes, Wagner
Fonte: O Globo, 15/04/2011, Economia, p. 25

Governo estuda reduzir tributo do setor para evitar que reajuste da Petrobras chegue às bombas

Pressionado pela Petrobras, o governo já estuda uma redução do valor da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para acomodar um reajuste da gasolina e evitar impacto nos preços cobrados do consumidor. A decisão, no entanto, ainda depende do efeito da medida para os cofres públicos. Isso porque, além da inflação, a equipe econômica tem em seu radar a preocupação com a área fiscal. Num ano em que o governo tem como compromisso cumprir a meta cheia de superávit primário (de 2,9% do Produto Interno Bruto), abrir mão de receitas não é algo simples. A Cide tem o valor fixado em reais e é cobrada sobre a importação e a comercialização de petróleo e derivados, gás e etanol.

- Temos que pesar uma redução da Cide na arrecadação. O desempenho fiscal da União este ano também será importante no esforço de domar a inflação - afirmou um integrante da equipe econômica.

Na quarta-feira passada, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, admitiu que poderia haver reajuste da gasolina se o preço do petróleo tipo Brent permanecer no patamar atual - ontem, o valor do barril subiu 0,24%, para US$122,91. Gabrielli alegou que uma variação muito grande de preços no mercado internacional prejudica a margem de lucro das refinarias. Na Horas depois, no entanto, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que "não está prevista nenhuma alta da gasolina no Brasil". Na sexta-feira passada, foi a vez de o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, garantir que a presidente Dilma Rousseff não concederá tão cedo à Petrobras o reajuste da gasolina que a estatal solicita.

Para o economista da Máxima Asset, Elson Teles, um ajuste na Cide é a única alternativa do governo diante de um eventual aumento da gasolina. Ele lembrou que o preço do combustível tem impacto direto de cerca de 4% no IPCA. Isso significa que um aumento de 5% na gasolina, por exemplo, elevaria sozinho o índice em 0,2 ponto percentual - a inflação de março, para efeito de comparação, fechou em 0,79%. Isso sem contar com o repasse que também pode ser dado aos preços do diesel e que ainda afeta o valor cobrado nas bombas.

- Qualquer reajuste na gasolina tem impacto na inflação, assim como ocorre com o diesel. Com certeza, se não tiver compensação da Cide, o índice vai ficar acima do teto da meta do ano (de 6,5%) e aumentar a pressão para 2012, que é onde o governo quer chegar ao centro (4,5%) - afirmou Teles.

Álcool começa a cair nas usinas paulistas

Somente no ano passado, a arrecadação da Cide chegou a quase R$8 bilhões. Em vários momentos, a equipe econômica já usou a contribuição como forma de reduzir os impactos de elevações da gasolina e do diesel nas refinarias. Em 2008, por exemplo, por causa da alta do petróleo e da inflação, o corte da contribuição resultou numa renúncia fiscal de R$3 bilhões. Para se ter ideia do que isto significaria este ano, o Ministério da Integração tem orçamento de R$2,8 bilhões em 2011, ao passo que a pasta da Justiça garantiu um total de R$3,2 bilhões.

Em 2009, por outro lado, o Tesouro Nacional estava precisando de receitas para se recuperar da crise financeira mundial. Como a cotação do petróleo estava baixa e a inflação sob controle, a Cide subiu e acabou resultando num ganho de R$1,5 bilhão.

Apesar do controle de preços no fornecimento, a gasolina vem subindo em 2011 a um ritmo superior ao da inflação. Pelos dados do IPCA, na média do Brasil, a inflação ficou em 2,44% no primeiro trimestre deste ano, ao passo que a gasolina subiu 3,13%. A última vez que o governo reajustou a gasolina nas refinarias sem reduzir o repasse nos postos foi em 2002.

A redução da Cide também pode representar uma dor de cabeça na relação da União com governadores e prefeitos, que recebem parte dessa arrecadação. De tudo o que é recolhido com o tributo, 29% são destinados a estados e municípios.

Já o preço do etanol hidratado, utilizado nos carros flex, começou a cair há duas semanas nas usinas de São Paulo, com o início da nova safra de cana-de-açúcar. Mas a queda ainda não foi repassada às bombas. Segundo um levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Universidade de São Paulo, o preço do álcool hidratado recuou 15,1% em 15 dias. Na semana de 4 a 8 de abril, o preço para os distribuidores ficou 4,97% menor, chegando a R$1,3854 o litro (sem impostos). Já o preço do etanol anidro, utilizado na mistura com a gasolina, ainda continua em alta, mas a tendência também é de queda assim que a oferta de produto da nova safra começar a aumentar.

- A queda de 15% na usina não será repassada na mesma proporção ao consumidor. Existem outros custos, como salários de funcionários e energia elétrica - disse Mirian Bacchi, pesquisadora do Cepea.

Sérgio Prado, representante do escritório de Ribeirão Preto da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) disse que o preço do álcool deve continuar caindo, já que as usinas estão apenas começando a moagem da cana. Segundo ele, a alta nos preços é automática, mas a redução nem sempre ocorre na mesma proporção.

O presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo (Sincopetro), José Alberto Paiva Gouveia, disse que o litro do álcool deve começar a cair nos próximos 15 dias.