Título: O exportador é um idiota
Autor: Fonseca, Roberto Giannetti da
Fonte: Correio Braziliense, 30/07/2009, Opinião, p. 21

Empresário e economista, presidente da Funcex ¿ Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior e diretor titular de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp

Talvez muitos não saibam, mas já se vão quase quatro décadas do tempo em que os exportadores brasileiros eram considerados heróis. Afinal, eram empresários ousados que, para expandir os negócios, abriam mercados pioneiros mundo afora. Para concorrer com exportadores estrangeiros, era preciso investir em qualidade, viabilizar soluções logísticas complexas, correr risco de crédito e de câmbio.

Não é por saudosismo que invoco essas memórias, mas para referir-me aos tempos em que as exportações brasileiras aumentaram vertiginosamente e deram condições de sobrevivência às contas externas do país nos momentos mais agudos de crise cambial da economia.

Foi em 1986 que percebi que o exportador brasileiro era um idiota. Repentinamente na edição do Plano Cruzado, inventaram que era preciso parar de exportar para que se desse preferência ao mercado interno. Para combater a inflação, entre outras sandices, congelaram a taxa de câmbio por prazo indefinido. Aos exportadores ficou a mensagem: quem quiser continuar exportando com prejuízo que o faça. E os idiotas continuaram.

Em 1988, a Constituição previu imunidades tributárias sobre as exportações, como a do ICMS, do ISS, do IPI e das contribuições sociais (PIS, Cofins, CSSL, CPMF, etc.) e Cide, incidentes sobre as receitas decorrentes de exportação. E novamente os idiotas acreditaram para, logo em seguida, assistirem aos estados se negando a devolver os créditos de ICMS acumulados sobre a pauta de produtos primários e semimanufaturados exportados.

O mesmo fez o governo federal ao criar legislação que resultou no acúmulo de créditos de PIS/Cofins das empresas exportadoras. Enquanto continuamos insistindo em exportar tributos, a maioria dos países industrializados e muitos emergentes aplicam a completa desoneração tributária das exportações por meio de mecanismos permitidos pela OMC conhecidos como tax rebate ou reintegro.

Pois bem, refiro-me agora ao rumoroso caso do Crédito Prêmio de IPI que, apesar do nome, nada tem a ver com prêmio ou com IPI, mas com o tal tax rebate, que reembolsa impostos indiretos não compensados na cadeia produtiva exportadora. Discute-se agora se o Congresso Nacional deveria ou não aprovar nova legislação por meio da MP 460, que poria fim ao litígio que os idiotas dos exportadores insistem em manter.

Os exportadores, por mais de 15 anos, ganharam cerca de 150 processos contra a Fazenda Nacional nos tribunais superiores e acreditaram na Justiça brasileira. Em 2007, em sessão especial do STJ, por 7 votos a 2, os exportadores ganharam de forma terminativa: o Crédito Prêmio não fora extinto em 1983 como alegava a Fazenda. Hoje o Supremo analisa se o Crédito Prêmio acabou em 1990 ou se continua válido.

Mas a Fazenda se recusa a aceitar a decisão e divulga que é vitoriosa nos tribunais. Diz que nunca negociou acordo, mas os idiotas dos exportadores estiveram nos últimos dois anos em mais de 30 reuniões, a convite daquele ministério, achando que era esse o tema que estava sendo tratado. Foram instruídos para que a solução surgisse por iniciativa do Congresso e assim o fizeram.

A emenda proposta é fruto do acordo que a Fazenda reluta em confirmar. Se fosse de lavra exclusiva dos exportadores, por que teria condições tão rigorosas, como prazo de vigência até 2002 em vez de 2009, ou a habilitação somente para empresas litigantes, ou ainda a compensação de créditos tributários a receber exclusivamente contra Dívida Ativa da União, devidamente constituída? A menos que os exportadores fossem declaradamente idiotas, por que teriam se autolimitado?

Sem apresentar nem um cálculo sequer, a Fazenda anunciou que a emenda representa ¿rombo¿ de R$ 288 bilhões. Como poderia ser, se os créditos a receber pelos exportadores não serão pagos à vista e só poderão ser compensados contra valores a pagar ao Fisco?

Pois bem, por unanimidade, situação e oposição aprovaram no Senado a emenda da senadora Lucia Vânia. E, para surpresa, a Fazenda diz que desconhecia o assunto apesar de ter inserido na mesma MP emendas de seu interesse. Cabe perguntar a esta altura quem é que manda neste país? Os governantes eleitos ou a burocracia instalada?

Com a palavra, os senhores deputados, a quem cabe agora decidir o destino dessa peleja tributária. Em breve teremos a resposta.