Título: Riscos do segundo turno no Peru
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Fonte: O Globo, 17/04/2011, Opinião, p. 6
Os peruanos tiveram ampla oferta de candidatos no primeiro turno. Entre os candidatos mais cotados havia um da esquerda nacionalista, uma da direita fujimorista e dois centristas. Os eleitores escolheram os dois primeiros e, no segundo turno, em 5 de junho, terão de definir quem vai para a Casa de Pizarro: o ex-militar Ollanta Humala, de 48 anos, vencedor do primeiro turno com 31,7% dos votos, ou Keiko, de 35 anos, filha do ex-presidente encarcerado Alberto Fujimori. Nada justifica otimismo quanto ao futuro do país.
Os dois candidatos moderados perderam terreno ao dividir os votos centristas. Eles representam (Alejandro Toledo) as reformas democráticas que se seguiram ao fim do governo autocrático de Fujimori nos anos 90; e (Pedro Pablo Kuczynski) as políticas fiscal e monetária ortodoxas que ajudaram a tornar a economia do Peru uma das de crescimento mais rápido do mundo (8,8% em 2010).
Ollanta (em inca, ¿guerreiro que tudo olha¿) Humala é um ex-militar que, em 2000, tentou um golpe frustrado contra Fujimori. Concorreu em 2006 contra Alan Garcia e perdeu no segundo turno. Na época, jogava no time de Hugo Chávez e prometia aplicar no Peru o kit bolivariano ¿ basicamente a convocação de uma assembleia para reformar a constituição e desmontar o Estado democrático.
Na versão 2011, suavizou o discurso com a ajuda de marqueteiros do PT que criaram o ¿Humalinha paz e amor¿. Em vez de Chávez, sua referência passou a ser o ex-presidente Lula. Afirmou que não deseja interferir no modelo econômico de sucesso do Peru e que respeitará a independência do banco central e os acordos de livre comércio feitos nas gestões anteriores. Mas confirma uma proposta de elevar em 30% impostos sobre os lucros das empresas de mineração, grande trunfo da economia peruana, e de melhorar a distribuição de renda ¿ a maior parte dos peruanos de fato não se beneficiou como deveria do crescimento econômico.
O candidato nacionalista saiu em busca dos votos dos perdedores do primeiro turno e se reuniu com o ex-prefeito de Lima, Luis Castañeda, quinto colocado, com o partido de Toledo, quarto, e com o terceiro, Kuczynski. Este pedira que Humala e Keiko firmassem um documento comprometendo-se, entre outros pontos, a respeitar a Constituição e a economia de mercado, por considerar que ambos ¿têm antecedentes preocupantes para a democracia¿.
A deputada Keiko, com 23,5% dos sufrágios, conta com o apoio dos fujimoristas e espera receber, em 5 de abril, os votos dos conservadores e dos ricos, aos quais Humala assusta. Fujimori tem cacife entre os pobres por seu programa habitacional para baixa renda e restaurantes populares. A ele se credita a derrota da hiperinflação e da guerrilha esquerdista que quase inviabilizaram o país. Mas também causa enorme rejeição pela corrupção e crimes contra a humanidade. Muitos temem que, eleita, Keiko liberte o pai. Assim, o grande risco que ronda o segundo turno no Peru é a eleição de um(a) aventureiro(a) que ponha a perder uma década de estabilidade, de resgate da imagem do país e de crescimento econômico. A proposta de Kuczynski de um compromisso conjunto com a democracia e a economia de mercado faz todo sentido.