Título: Cerco à lavanderia da Rocinha
Autor: Costa, Ana Claudia; Moura, Athos
Fonte: O Globo, 20/04/2011, Rio, p. 12

Polícia faz operação contra empresas que legalizariam os milionários lucros do tráfico

POLICIAIS RETIRAM pela janela parte das três toneladas de maconha apreendidas na Rocinha: droga valeria R$3 milhões

ELETRODOMÉSTICOS ROUBADOS, achados em um depósito, são recolhidos

Cinco pequenas empresas legalizadas na Zona Sul e na Rocinha estão sendo investigadas sob suspeita de lavarem o dinheiro para traficantes de drogas da favela. Para desarticular a quadrilha, identificada após sete meses de investigações da Polinter a Polícia Civil desencadeou ontem uma operação na Rocinha, um dos últimos redutos do tráfico na Zona Sul. O objetivo era cumprir 30 mandados de prisão de pessoas ligadas ao traficante Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, mas apenas duas pessoas que eram procuradas foram presas. Na ação, nenhuma arma foi apreendida, e Nem, mais uma vez, escapou. Apesar de moradores da Rocinha afirmarem que, na noite de segunda-feira, três policiais do 23º BPM (Leblon) subiram a favela avisando da operação, a chefe de Polícia Civil, delegada Martha Rocha, e o comando da PM negaram que tenha havido vazamento de informações. A polícia informou que não poderia divulgar os nomes das empresas para não prejudicar as investigações.

Esquema funciona há cinco anos

De acordo com o delegado titular da Polinter, Rafael Willis, nos últimos cinco anos traficantes da Rocinha usam empresas legais para legitimar os lucros da venda de drogas. Para controlar as firmas, Nem utiliza pessoas de sua confiança e parentes, mas as investigações indicam que essas pessoas não têm condições financeiras de estar à frente dos negócios.

¿ Verificamos que essas pessoas não possuem patrimônio compatível para terem as empresas, incluindo até caminhões de transporte ¿ disse o delegado.

A polícia estima que o tráfico na Rocinha movimente semanalmente de R$1,8 milhão a R$2 milhões. Entre os mandados de prisão, havia um para o presidente da Associação de Moradores da localidade conhecida como Bairro Barcelos, Vanderlan de Barros Oliveira, o Feijão. Ele, no entanto, não foi encontrado. Em agosto passado, Feijão participou das negociações com traficantes do bando de Nem que haviam invadido o Hotel Intercontinental, em São Conrado. Depois, em depoimento à polícia, ele admitiu ter recolhido as joias dos criminosos antes que estes se rendessem, para evitar que fossem apreendidas.

Onze pessoas foram presas na operação de ontem, mas somente duas estavam na lista dos 30 procurados: o taxista Fábio Silva Encarnação, de 27 anos, acusado de transportar armas e traficantes entre favelas da mesma facção da Rocinha; e Tairone Manhães Alexandrino, braço direito do gerente do tráfico na Rocinha, conhecido como Leão. Policiais prenderam oito pessoas por envolvimento com produtos piratas e um homem flagrado com uma granada.

Durante a operação, três toneladas de maconha, avaliadas em R$3 milhões, foram apreendidas na Rua 4, conhecida como Rua Nova. Segundo Rafael Willis, esse era o maior depósito de drogas da favela.

Para Martha Rocha, a operação foi um sucesso, pois não houve dano à população e a apreensão de drogas implicou grande prejuízo para a quadrilha. Segundo ela, a ação será desmembrada, pois a polícia ainda não atingiu todos os objetivos.

Além da maconha, foram apreendidos mais de três mil produtos piratas, entre tênis, roupas e mídias, num depósito no camelódromo da Rocinha. Uma central onde eram feitas cópias de CDs e DVDs também foi encontrada. O delegado titular da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Propriedade Imaterial (DRCPIM), Alessandro Thiers, disse que o depósito de mercadorias pirateadas foi uma surpresa para a polícia. Ele acredita que, com as operações no camelódromo da Uruguaiana, no Centro, a Rocinha possa ter se transformado em entreposto para essas mercadorias.

Na incursão na favela, a polícia encontrou ainda, num barraco na Rua do Valão, um carregamento de eletrodomésticos que fora roubado e seria entregue em Jacarepaguá. Foram recuperados geladeiras de alto padrão, aparelhos de ar condicionado e máquinas de lavar roupas. Na Rua do Canal, a polícia achou uma central de distribuição de sinal pirata de TV a cabo. Policiais da Delegacia de Roubos e Furtos de Automóveis (DRFA) apreenderam ainda 57 motocicletas e sete carros ¿ cinco automóveis e 31 motocicletas eram roubados. Os outros veículos estavam sem placa ou sem documentação.

A operação começou por volta da 6h, quando cerca de 200 policiais começaram a subir a favela por diversos acessos. Dois helicópteros e dois carros da polícia auxiliaram as equipes. Apesar do aparato policial, não houve confrontos. Com a chegada da polícia, traficantes soltaram fogos. Wagner Luiz de Oliveira foi preso em flagrante com uma granada nas mãos. No alto da favela, policiais encontraram uma casa que pertenceria ao traficante Anderson Rosa Mendonça, o Coelho, que chefiava o tráfico nos morros de São Carlos e Querosene, recém-ocupados para a instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).

oglobo.com.br/rio