Título: Reformas em Cuba são insuficientes
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Fonte: O Globo, 20/04/2011, Opinião, p. 6

Cuba, um dos dois últimos regimes stalinistas do mundo - o outro é a Coreia do Norte -, tornou-se completamente inviável. A velha guarda dirigente não pôde mais adiar a reunião da mais alta instância decisória, o congresso do Partido Comunista, que não se realizava há 14 anos. Os resultados foram decepcionantes. A liderança virou o país na direção certa, a das reformas, mas a velocidade é a de uma carroça, quando deveria ser supersônica.

Uma das necessidades básicas é rejuvenescer a liderança. Raúl, de 79 anos, assumiu formalmente o cargo de Fidel, de primeiro-secretário. Mas para número dois escalou Machado Ventura, de 80, decepcionando quem esperava sangue novo no topo. Foi um grande avanço o fato de Raúl ter proposto que os dirigentes, inclusive ele, só possam exercer dois mandatos de cinco anos cada. Fidel ficou 50.

Formalidades à parte, o mais urgente é pôr a economia em movimento e desonerar o Estado. A maior limitação foi exposta, obviamente sem essa intenção, por Raúl Castro, quando disse que é preciso reformar a economia, mas que ela continuará socialista, com plane-jamento central. Está fartamente provado que eficiência não é o forte das economias socialistas.

Registre-se que o congresso do PC cubano aprovou mais de 300 propostas para liberalizar a economia, cortar gastos do governo com subsídios, dar mais autonomia às estatais e incentivar o investimento estrangeiro. As duas mudanças que mais interessam ao cidadão é a progressiva supressão da caderneta de racionamento, que garante a cada cubano uma cesta básica minimalista mensal, e a permissão para compra e venda de imóveis e de veículos.

Algumas das mudanças apresentadas no congresso do PC já estão em andamento. Nos últimos meses, os cubanos tiraram mais de 170 mil licenças para abrir negócios como venda de flores, salões de beleza, táxis e restaurantes. O governo espera que isso absorva parte de um milhão de funcionários públicos que, como já fora anunciado, serão demitidos. Está em vigor também a autorização para que fazendeiros aluguem terras em poder do Estado para trabalhar.

Não é a primeira vez que Cuba abre para os pequenos negócios. Isso foi feito por Fidel Castro após o colapso da União Soviética, mantenedora do país até então. Mas bastou a economia melhorar um pouco, com a infusão de petrodólares do "magnata socialista" Hugo Chávez, para a experiência ser abandonada. O país chegou a ter 208 mil pessoas trabalhando por conta própria em 2006, mas o número caiu para 143 mil no início deste ano. Chávez enredou-se em seus próprios desmandos e a fonte venezuelana secou. Entrou a China com seus milhões e sua sede insaciável de produtos de toda espécie. Porém, os chineses começaram a cobrar parcelas atrasadas da dívida, e o PC cubano entendeu que teria de se virar para o castelo stalinista não ruir descontroladamente. Mas, para que isso não aconteça, é necessário iniciar uma distensão política na ilha, libertar dissidentes, afrouxar a repressão, abrir um diálogo sério com os opositores e elaborar um cronograma para democratizar o país. Essas medidas possibilitariam a Cuba discutir com os EUA o fim do embargo comercial. Contudo, parece que isso terá de esperar um novo congresso do PC. Se der tempo.